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Tarifas de Trump e o Porto de Santos: o que vai acontecer?

Fonte: Juicy Santos / Flávia Saad*
 
Moramos na cidade com o principal motor do comércio exterior brasileiro e da América Latina. E as águas de Santos começam a sentir a ondulação de uma nova tempestade global: as tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Desde que assumiu a presidência em 2025, Trump implementa uma série de tarifas comerciais com o objetivo declarado de proteger a indústria nacional americana, reduzir déficits comerciais e combater práticas comerciais consideradas injustas. E isso fez surgir a pergunta: o que vem por aí com as tarifas de Trump e o porto de Santos? E qual será o impacto dessas medidas no comércio marítimo?
 
O que é a guerra tarifária de Trump?
 
Vamos a um contexto rápido. O presidente dos EUA iniciou a sua segunda administração com uma postura agressiva em relação ao comércio internacional. O Observatório de Tarifas do ótimo Correio Sabiá mapeou diversas taxas anunciadas e implementadas desde fevereiro de 2025. Entre as medidas mais significativas, estão a imposição de uma tarifa global de 10% sobre todas as importações, uma taxa de 25% sobre automóveis importados e impostos de 25% sobre as importações de aço e alumínio.
 
Estas tarifas não se restringem a um único país ou bloco económico. Embora a China e a União Europeia (UE) tenham sido alvos frequentes de retórica e de taxas mais elevadas, o Brasil também entrou no chamado “Dia da Libertação” de Trump, com a imposição de uma tarifa de 10% sobre todas as importações brasileiras.
 
Ele justificou estas ações como uma “declaração de independência econômica”, visando proteger a indústria americana e corrigir desequilíbrios comerciais.
 
A lógica por trás das tarifas, segundo Trump, é forçar outros países a adotarem práticas comerciais mais “recíprocas” e a transferirem a produção para os Estados Unidos. No entanto, muitos analistas consideram estas medidas um “choque brutal” para a economia mundial, comparável à crise dos anos 1930.
 
As reações ao redor do mundo
 
O anúncio e a implementação das tarifas de Trump geraram ondas de choque na economia global. Bolsas de valores em todo o mundo registaram quedas significativas e a incerteza paralisou decisões empresariais. Empresas multinacionais que produzem em países como o Vietnam, China ou na Europa agora estão avaliando seus próximos passos.
 
Vários países e blocos econômicos manifestaram a sua preocupação e anunciaram possíveis retaliações aos EUA. A China, por exemplo, respondeu com uma tarifa de 34% sobre todas as importações dos EUA. A União Europeia também indicou possíveis medidas de retorno.
 
O Japão, por meio do seu primeiro-ministro, Shigeru Ishiba, pediu a Trump para reconsiderar as tarifas, salientando o investimento japonês nos EUA. O Canadá, embora tenha suspendido temporariamente as tarifas adicionais após negociações, também considerou medidas de reciprocidade.
 
Essa guerra comercial desencadeada pelas tarifas de Trump levanta sérias preocupações sobre a sustentabilidade do comércio global e o potencial para uma recessão global. A Organização Mundial do Comércio (OMC) projeta que o aumento das tarifas americanas poderá reduzir em 1% o comércio mundial este ano.
 
O Brasil e as tarifas de Trump
 
Apesar de o Brasil não ser o principal alvo da retórica protecionista de Trump, o país foi atingido com uma tarifa de 10% sobre todas as exportações para os Estados Unidos. Esta taxa, embora menor do que as aplicadas a outros países como a China (até 54%) ou a Índia (26%), representa um encarecimento dos produtos brasileiros para empresas e consumidores americanos.
 
Alguns setores brasileiros serão particularmente afetados. A indústria do aço e do alumínio, por exemplo, enfrenta uma tarifa de 25% nos EUA. Produtos derivados de ferro e aço são o segundo item mais exportado pelo Brasil para os EUA. A automobilística, com uma tarifa de 25% sobre importações, também sofrerá as consequências na importação de autopeças brasileiras. A fabricante de aviões Embraer aparece como uma das companhias mais vulneráveis.
 
O governo brasileiro prometeu negociar antes de instituir qualquer retaliação generalizada. O país mobilizou um arsenal de medidas, incluindo um projeto de lei aprovado pelo Congresso que estabelece mecanismos de reação a políticas que interfiram nas escolhas soberanas do Brasil ou violem acordos comerciais. Recorrer à OMC também é uma possibilidade, embora o órgão esteja paralisado.
 
Apesar dos desafios, alguns especialistas apontam para oportunidades para o Brasil. O aumento das tarifas sobre produtos de outros países pode aumentar a competitividade dos produtos brasileiros no mercado americano. O Brasil, como grande exportador de commodities agrícolas, pode se beneficiar do redirecionamento das compras da China, que deverá reduzir as importações dos EUA.
 
E o gigante porto de Santos?
 
E como tudo isto afeta o Porto de Santos, o maior complexo portuário do Brasil e da América Latina? Como principal porta de entrada e saída do comércio brasileiro, Santos está intrinsecamente ligado à saúde da economia global e às relações comerciais do país.
 
O aumento das tarifas de Trump inevitavelmente levará a uma reconfiguração dos fluxos comerciais. Com o encarecimento dos produtos brasileiros nos EUA, poderá haver uma diminuição no volume de exportações para aquele destino, especialmente nos setores mais afetados pelas tarifas elevadas, como o aço, alumínio e autopeças.
 
Isso poderá traduzir-se numa menor movimentação de carga no Porto de Santos, com potenciais impactos nas receitas e na atividade econômica local.
 
Navegando em novos mercados
 
Por outro lado, o cenário de guerra comercial tem como gerar novas oportunidades. Se o Brasil conseguir expandir as suas exportações para outros mercados, como a China e a União Europeia, o Porto de Santos poderá beneficiar do aumento do volume de carga para esses destinos. A capacidade do porto em lidar com diferentes tipos de mercadorias e a sua infraestrutura logística serão cruciais para capitalizar estas novas rotas comerciais.
 
O Porto do Açu (RJ), por exemplo, já regista um aumento na procura por ferro-gusa e soja. Adicionalmente, a tensão entre EUA e Europa pode impulsionar a implementação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia.
 
Portanto, Santos pode seguir uma trajetória semelhante, adaptando-se às novas dinâmicas.
 
Contudo, a incerteza gerada pelas políticas comerciais de Trump é um dos maiores desafios. As constantes mudanças nas tarifas e a imprevisibilidade das ações do governo americano dificultam o planejamento a longo prazo para os operadores portuários, exportadores e importadores que utilizam o Porto de Santos. Vale dizer que a possibilidade de retaliações por parte de outros países também adiciona uma camada de complexidade, podendo afetar indiretamente o comércio brasileiro e, consequentemente, o movimento no porto.
 
Além disso, as tarifas podem levar a um aumento da inflação nos Estados Unidos, o que poderá reduzir o poder de compra dos consumidores americanos e, consequentemente, a procura por produtos importados, incluindo os do Brasil que passam por Santos.
 
*Flávia Saad, jornalista formada pela Universidade Metodista de São Paulo e com MBA em Gestão de Marketing pela Esamc Santos, tem mais de 20 anos de carreira em jornalismo. Trabalhou em redações em São Paulo (editoras Abril e Símbolo) e Santos (Jornal A Tribuna) por 10 anos antes de fundar, com Ludmilla Rossi (Mkt Virtual e Juicyhub), o Juicy Santos, referência em jornalismo independente multiplataforma na Baixada Santista desde 2011. Também é sócia-fundadora da Juicydeli, operação de varejo de produtos afetivos do grupo. Em 2023, o Juicy Santos conta com mais de 200 mil seguidores em suas redes sociais, amplificando as vozes e contando histórias potentes sobre a cidade de Santos e a região da Baixada Santista - on e offline.
 

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