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Terceirização de operações portuárias e locação de áreas em TUPs

Fonte: Agência iNFRA / Rodrigo Bernardes Braga*
 
Em recente decisão, a diretoria da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) autorizou a terceirização da exploração da infraestrutura portuária e locação de áreas dentro dos TUPs (Terminais de Uso Privado), convalidando uma visão mais aberta e arejada em relação aos termos da outorga de autorização e do contrato de adesão. 
 
O entendimento foi externado pela ANTAQ por ocasião do julgamento do Processo 50300.006165/2022-01, objeto do Acórdão 297/2023. Em consulta formulada que tomou o referido processo, a ANTAQ reiterou o entendimento firmado anteriormente agora em voto da relatoria do diretor Eduardo Nery. O diretor ponderou que “[…] em especial no que se refere à contratação de operadores portuários terceirizados por parte de titulares de contratos de adesão, reafirmo o entendimento de que não se justifica impor tamanha restrição aos terminais de uso privado se elas sequer existem para terminais públicos. Em outras palavras, se um arrendatário pode contratar um operador portuário para realizar os serviços, não vejo razão para impedir que o autorizatário também o faça.”
 
Na mesma oportunidade, analisou-se a possibilidade de celebração de contratos de locação de áreas pelo titular da autorização com terceiros. De igual modo, a ANTAQ verificou que não havia impedimento à celebração de tais contratos, pois não se vislumbrou desvirtuamento da finalidade da outorga. Entendeu-se que a locação não representa automaticamente a perda da posse ou do direito de uso da área.
 
Em lúcido voto, o diretor Eduardo Nery considerou que o art. 4º, inc. VII, da Resolução ANTAQ 71/2022, estabelece como um dos documentos necessários à obtenção da outorga o título de propriedade do terreno, inscrição de ocupação, certidão de aforamento ou contrato de cessão sob regime de direito real, ou outro instrumento jurídico que assegure o direito de uso e fruição do terreno. A posse, nesse caso, “deve ser vista de maneira funcional e teleológica”, segundo ele. Ou seja, “o autorizatário que celebra um contrato de locação ainda está exercendo seu direito de fruição sobre o terreno, uma vez que escolhe ceder parte da área para que um terceiro, com expertise específica, possa operar e aproveitar o terreno de maneira mais eficiente.
 
Nesse caso, a locação de área não implica perda do direito de uso e fruição, mas sim um exercício desse direito de forma estratégica, para melhor atender aos objetivos da outorga”.
 
O voto do diretor vai na direção de acolher a pretensão de aluguel de áreas em TUPs por entender que estes poderiam funcionar como “landlord” privados e facilitadores para que empresas menores, sem capacidade financeira e logística para construir e operar os seus próprios terminais, possam usar parte da infraestrutura construída e aparelhada para realizar as suas operações portuárias. Evidentemente, o voto prestigia a dinamicidade do mercado e contribui para reduzir a ociosidade da infraestrutura portuária, aumentando a oferta de serviços no setor.
 
Vale lembrar que a nossa Suprema Corte já tinha entendido que a terceirização de atividade-fim da empresa era permitida em tema de repercussão geral (Tema 725), no “leading case” (RE 958252), da lavra do ministro Luiz Fux.
 
Finalmente, a deliberação da ANTAQ revela que não há impedimentos à celebração de contratos privados de prestação de serviços ou de locação de áreas específicas dentro dos TUPs, observadas as seguintes premissas: (i) seja mantida a responsabilidade integral do titular da outorga perante a ANTAQ e demais autoridades competentes; (ii) não haja desvirtuamento do objeto da outorga ou transferência de responsabilidade regulatória; (iii) seja preservada a competência da ANTAQ para intervir e adotar medidas cabíveis em casos concretos, sempre que necessário; (iv) não exista cláusula no contrato de adesão que vede a operação portuária por terceiros; e (v) seja encaminhada à ANTAQ cópia dos contratos de prestação de serviços e de locação no prazo de até́ 30 dias após a sua celebração, observadas as condicionantes estabelecidas nos subitens anteriores.
 
Os TUPs operam sob um regime privado cuja flexibilidade operacional e liberdade de precificação são a tônica desse importante segmento. Embora não sejam operadores portuários, tecnicamente falando, desempenham operações portuárias de acordo com o que vier a disciplinar o titular da respectiva autorização, conforme art. 30 da Lei 12.815/13. Podem, por exemplo, terceirizar a exploração da infraestrutura portuária na medida de seu interesse e atentos à realidade do contrato de adesão. Claramente não poderão terceirizar a movimentação de cargas não previstas nos contratos de adesão ou por tempo incompatível com os mesmos contratos.
 
Finalmente, a terceirização da exploração ou a locação de áreas dentro dos TUPs não os desoneram de responder integralmente pelos compromissos regulatórios assumidos, nem afastam a fiscalização da ANTAQ.  
 
*Rodrigo Bernardes Braga é advogado, ex-diretor Jurídico e Regulatório do Porto de Vitória e Barra do Riacho. É sócio da Prática de Infraestrutura do escritório Godinho Barbosa.
 

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