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“Quantos prefeitos entraram e saíram em Santos sem pisar no Porto?”, questiona presidente da Marimex
Fonte: A Tribuna On-line
A Tribuna entrevista Antonio Carlos Fonseca Cristiano, o Caio
Aos 71 anos de idade e 47 anos atuando como empresário da área portuária, Antonio Carlos Fonseca Cristiano é sinônimo de resiliência e foco para alcançar o sucesso. Conhecido no setor como Caio, apelido que ganhou na infância, ele reestruturou a Marimex, assumindo os negócios do pai, Osvaldo Cristiano, no final dos anos 1970. Ainda muito jovem, resolveu expandir as atividades da despachante aduaneira e tornou a empresa santista uma referência em logística integrada. Hoje, a companhia presidida por Caio faz o agenciamento de cargas, desembaraço aduaneiro, transporte rodoviário, além de possuir terminal alfandegado e centro de distribuição. A Marimex tem, atualmente, 1,4 mil colaboradores e movimenta 82,8 mil contêineres por ano. É responsável por 10% de tudo que entra via Porto de Santos e 5% do Brasil. Leia a seguir trechos da entrevista feita com Caio na sede da empresa, na Rua Xavier Pinheiro, no Macuco.
Como foi a sua entrada na Marimex?
Eu tinha 24 anos e dois diplomas, de engenheiro eletrônico e de administrador de empresas. E o que eu sabia fazer na vida? Nada. Cheguei a trabalhar um tempo em uma empresa, na área de informática, mas era sem graça. Aí falei para meu pai: vou trabalhar contigo. A empresa era pequena (fazia apenas despachos aduaneiros), mas estava num momento bom para despachantes. Naquela época era diferente, chegava mercadoria no Porto e o despachante tinha que ir lá, abria tudo e voltava para o escritório para fazer os documentos. Aí, em 1979, a gente teve uma série de problemas, dificuldades na empresa. Meu pai praticamente perdeu tudo o que ganhou. Ele se afastou em 1982, quando eu estava uns 4 anos aqui dentro, ainda aprendendo, e faleceu em 1984.
O senhor chegou à empresa em um momento muito difícil, como foram esses momentos?
Eu diria que o mais normal seria deixar a empresa explodir, né? Mas eu tinha estudado, meu pai sempre me deu tudo o que eu precisei. Na hora que chegou a minha vez, pensei: agora tem que provar que você é homem, né? E ali era quase do zero. Mas eu não nasci folgado, nasci para trabalhar. Optei por continuar, principalmente porque a empresa carregava o nome do meu pai. A Marimex foi criada por ele. Levei bordoada de tudo que foi lado, mas é preciso seguir em frente, não se vive de passado.
Como transformou a empresa?
Quando meu pai se afastou e eu fiquei sozinho, eram 60 funcionários. Eu reduzi para 24. No começo, eu passei a alugar as empilhadeiras que eu tinha, achei que iria sobreviver disso. Mas não durou muito. Mas eu tive a chance de fazer alguma coisa de exportação. Então, consegui alugar na Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo) um armazém abandonado. Teve uma espécie de licitação, que na época era diferente de hoje, eu ganhei e reformei esse armazém aos poucos. Fui reformando e trabalhando com exportação. Nossa margem de rentabilidade era muito baixa, mas era o que tinha. Até que em 1995 o Governo (Federal) soltou dois decretos para regularizar a situação da Petrobras no Brasil, em termos de portos. E esses dois decretos permitiram que nós e outras empresas pedíssemos alfandegamento. Sou alfandegado desde 1997, a partir daí a empresa cresceu, com uma atividade muito lucrativa. E hoje temos uma faixa de 1,4 mil colaboradores.
Quando o senhor olha para trás, com tudo o que aconteceu, o que pensa?
Que as lições de crescimento, desenvolvimento e as oportunidades que eu tive, eu abracei dentro do possível. A oportunidade veio e eu não fugi dela. Com certeza eu também errei em algumas coisas. Um dos meus erros foi não ter estudado Direito, porque a gente é obrigado a aprender com os advogados. E se você tem problema hoje, resolva. Se você pensar pequeno, você fica pequeno. Não é fazer qualquer loucura, mas precisa querer. Nesse trajeto tenho uma série de lições. A gente sobreviveu. Acho que está dando certo, né?
Quais são seus sonhos ainda com relação à Marimex?
Hoje os armadores estrangeiros tomam conta do Porto. A batalha é outra, muito mais pesada. Mas eu continuo achando que a gente sempre tem uma vantagem. Porque eu sou o responsável pela empresa, eu não sou o CEO. Se eu der mais resultado ou menos resultado, não muda nada para mim. Claro que ninguém quer desvalorizar. A minha lição de passado me dá forças. E tenho um lema: goste do que você faz e trabalhe. Depois de trabalhar, sabe o que você faz? Trabalhe mais. Claro que eu queria ganhar na loteria, porque quase 50 funcionários aqui ganharam (bolão entre os colaboradores da empresa ganhou R$ 122 milhões na Mega-Sena em 2022), mas trabalhar é a regra.
Qual o maior problema do Porto de Santos hoje?
Entrou a política. Tudo tem muito a ver com a política, indicação, cargos, enfim. Quando eu comecei a iniciativa privada estava entregando a gestão do Porto para o Governo (foi criada a Codesp, em 1980). E a gente viu uma empresa grande virar o que é hoje. É um processo destrutivo que acontece ao longo do tempo, a partir do momento que fizeram política dentro da empresa. O que tem aí hoje é resíduo de alguma coisa muito estragada. Não que a culpa seja das pessoas que estão hoje, mas é histórico muito mal administrado. E a atual diretoria, o presidente Anderson Pomini, está indo bem. Faz tempo que a gente não via alguém com tranquilidade para tentar resolver as coisas sem brigar. Porque o governo anterior só sabia brigar. As empresas daqui precisam ser valorizadas. Só de impostos a minha atividade gera R$ 4 bilhões por ano.
O Governo Bolsonaro queria a privatização da administração portuária, que foi descartada na atual gestão. Não seria um remédio contra a politicagem?
Sou 100% contra. O presidente Lula foi inteligente ao frear essa conversa. Se privatizasse, no dia seguinte iriam fazer pedágio para entrar e sair do Porto. O Porto já está privatizado, cada empresa com seu produto. E o cliente vai aonde tem melhor preço, eficiência. E você tem que ter liberdade. Um dos erros na minha visão é entregar áreas públicas para donos de carga. Não deveria ser usada área do Porto como armazenamento, que é o que está sendo feito. Isso falta de preparo de quem tomou as decisões por incapacidade. E, em alguns instantes, sem dúvida, intencionalmente. A Marimex nunca viveu da política, eu não tenho partido político, não sou político. Tenho que tocar minha empresa.
Como o senhor analisa os governos Municipal, Estadual e Federal em relação ao Porto?
Quantos prefeitos entraram e saíram em Santos sem pisar no Porto? E não é o Governo do Estado que vai resolver os problemas. Santos precisa ter uma Autoridade Portuária bem definida, com CAP (Conselho de Autoridade Portuária) atuante, com poder deliberativo, não só consultivo. E ser cobrada como uma empresa normal.
E sobre o perfil do trabalho no Porto, mudou muito com a tecnologia? Com avalia?
A minha empresa investe bastante em qualificação, treinamento. Mas somos uma formiguinha perto do Porto. Eu vejo a preparação de profissionais como determinante para o futuro do Porto. Pode ter inteligência artificial ou o que quiser, mas a pessoa tem que ser valorizada.
Há uma polêmica ainda sobre a cobrança de IPTU pela Prefeitura de empresas do Porto. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é legal a cobrança, mas o senhor não acha...
Cada um, dentro dos seus interesses, tira proveito daquilo que pode. A Prefeitura de Santos foi beneficiada pela decisão, tem milhões a receber. De mim, não recebeu um centavo. Tenho carnê aberto desde 2001. Não é que eu não vou pagar, vou provar que não tem que pagar. É diferente. Precisaria vender minha empresa para pagar isso. Quando comecei não existia cobrança de IPTU, no meu contrato não tem. Ninguém me chamou e falou: olha, agora vai ter isso aqui para pagar, vamos fazer reequilíbrio no contrato? Vou provar na Justiça que é ilegal.
O que o senhor acha dessa polêmica envolvendo a área do STS10, que seria para contêineres, no cais do Saboó?
Existe um lugar de Santos que é conhecido como Faixa de Gaza: o STS10. Todo mundo quer e isso ficou mais acentuado com a vinda de terminais estrangeiros, que têm capacidade financeira para trabalhar em Brasília. E lá, (no Governo) não sabem nem o que estão fazendo, criam esse tumulto. Acho que o STS10 é extremamente necessário, o Porto precisa para o futuro, não para agora. E tem que ser inteiro para contêineres, nada de fracionar pedaço. Mas vai precisar da mão do Governo para ter um equilíbrio no mercado, excluir algumas empresas desse processo. Mas sem pressa.
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