Artigos e Entrevistas

Uma promessa pela confiança do mercado

Fonte: A Tribuna On-line / Flavia Maya*
 
Título verde deve ser encarado como vantagem financeira e reputacional, porém precisa ser lastreado em ações efetivas
 
Como uma advogada que atua na intersecção entre Direito e Desenvolvimento Sustentável, me interessa muito a jornada de empresas que estão começando a ter contato com o tema de sustentabilidade e impacto. É sempre interessante estar junto das empresas e ajudá-las a identificar oportunidades, montar um plano de ação e de se apropriar do significado de atuação sustentável, que para cada companhia deverá ter uma forma e um caminho a ser percorrido.
 
Eu considero o processo similar, guardadas as particularidades, ao que nós observamos há pouco mais de 20 anos no Brasil com relação à governança corporativa. A evolução da compreensão e aplicação dos parâmetros ideais de governança corporativa ocorreu de forma progressiva, e nem todas as empresas se dedicaram a investir imediatamente no aprimoramento dessa frente. As que o fizeram, contudo, obtiveram uma vantagem que talvez não fosse mensurável de imediato, mas que logo se reverteu financeiramente: a percepção de risco corporativo.
 
Voltando para o tema de Desenvolvimento Sustentável e Impacto, existem mais camadas de incentivo, como o fato de que essa talvez seja a única forma de conciliar o desenvolvimento econômico e, assumindo o risco de soar apocalíptica, a subsistência da espécie humana no nosso planeta. Mas o incentivo financeiro também é considerável, tanto em aspectos de eficiência e produtividade como também em relação à percepção de risco corporativo, já mencionada.
 
Para empresas que desejam dar um passo adiante e captar recursos junto ao mercado para financiar projetos - ou mesmo suas atividades de forma geral -, a percepção de risco se traduz em dinheiro na mesa. E é nesse momento em que os títulos verdes, denominação genérica para títulos atrelados a projetos ou metas socioambientais, se apresentam como uma vantagem.
 
Existem, claro, os títulos verdes com incentivos fiscais do Governo Federal, especificamente as debêntures incentivadas contempladas pela Lei Federal 12.431/2011. Ou seja, debêntures destinadas a custear projetos ambientalmente sustentáveis nos setores de logística e transporte, mobilidade urbana, energia e saneamento básico. O incentivo abrange a redução de alíquota de Imposto de Renda (IR), podendo chegar a zero para investidores pessoa física. Embora o benefício direto seja direcionado ao investidor, ele se reflete positivamente nas taxas e custo geral da operação.
 
Contudo, os demais títulos, destinados a projetos distintos daqueles abrangidos pela Lei 12.431/11, também representam vantagem competitiva. Isso porque, para que a emissão possa ser enquadrada em uma das categorias de títulos verdes, é preciso que ela apresente destinação clara relacionada a um dos objetivos de desenvolvimento sustentável.
 
Dessa forma, o próprio título se torna um compromisso corporativo com esses objetivos, aumentando o grau de confiança do mercado no papel e reduzindo, portanto, a percepção de risco da operação. Até porque, quando a garantia de um título é a reputação da empresa, o risco de descumprimento reduz consideravelmente.
 
Por esse aspecto, considero fundamental que o emissor possua já alguma maturidade em relação ao tema e tenha controle dos processos e riscos que possam afetar negativamente os compromissos a um título verde, de forma a evitar danos reputacionais.
 
Os títulos verdes, portanto, devem ser encarados sim como vantagem financeira e reputacional. Porém, eles precisam ser lastreados em ações efetivas, que reflitam uma cultura organizacional alinhada com os compromissos assumidos com o investidor. Isso porque, se por um lado o ganho de confiança gera benefícios financeiros mensuráveis, a sua perda perante o mercado poderá ser inestimável.
 
*Flávia Maya, advogada corporativa e especialista em diversidade
 

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