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Agências reguladoras livres

Fonte: A Tribuna On-line - Editorial
 
Uma mudança agora significa desmontar experiência de décadas em troca de previsível interferência política
 
A proposta de criação de conselhos para deliberação de atividades normativas, com uma função similar e paralela à das agências reguladoras, é um desserviço à sociedade. A possível mudança preocupa com razão as entidades que representam empresas hoje atendidas pelo atual sistema, que tem pelo menos três décadas em operação e que precisa, sim, ser aperfeiçoado, mas não alterado radicalmente. A iniciativa indica ainda um risco de disseminação de indicações políticas para assuntos de fiscalização e regulação de áreas que geram muitos conflitos de interesse. O que se deve buscar é profissionalização, transparência, celeridade e confiança.
 
A iniciativa partiu do deputado federal Danilo Forte (União-CE), que inseriu a proposta como emenda na Medida Provisória (MP) 1.154 assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para reorganizar os ministérios. Como na prática a MP acomoda o novo governo na atual estrutura administrativa federal (inclusive atender a adesão dos partidos à base governista), a proposta do parlamentar é vista com um jabuti, termo que se refere a ideias que não têm relação ao texto original. O objetivo da emenda é criar os conselhos temáticos vinculados às agências reguladoras e aos ministérios para tomar decisões sobre áreas específicas.
 
Na prática, as agências reguladoras perderiam a autonomia, pois elas tomariam decisões compartilhadas com os ministérios de sua área e os conselhos temáticos, sendo estes dois últimos de natureza política. No caso das agências, hoje seus componentes dependem de nomeação pelo presidente e sabatina pelo Senado. Essa diretoria, porém, atua de forma independente até seus mandatos terminarem. Uma estratégia de interferência, quando suas atuações desagradam o governo da ocasião, é não indicar um diretor, dificultando decisões.
 
Entretanto, esses organismos prestam bons serviços na regulação de serviços sob concessão, como rodovias, na área de saúde suplementar, no saneamento básico e na fiscalização do setor de energia. A maior vantagem é a transparência, bem diferente das decisões que são tomadas nos ministérios, de natureza mais executiva, anunciando investimentos e destinando recursos. Com as agências, fica o papel de estipular regras e fiscalizar a atuação do governo e das empresas dos setores regulamentados.
 
O que preocupa é que historicamente os governos petistas tendem a questionar as agências, que surgiram nos anos 1990. Aliás, em outra instância, a própria autonomia do Banco Central está na mira do presidente Lula. Nenhum sistema é perfeito e livre de influências políticas ou dos interesses da iniciativa privada, mas compete ao Parlamento e à sociedade discutir mecanismos para blindá-las de eventuais desvirtuamento.
 
Uma mudança tão radical significa desmontar uma experiência de décadas em troca de previsível interferência política em decisões de natureza técnica das 11 agências em funcionamento.
 

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