Artigos e Entrevistas

Agentes marítimos sob ameaça

Fonte: A Tribuna On-line / Marcelo Sammarco*
 
Das 320 agências marítimas estabelecidas no país, 48 estão no Porto de Santos
 
 
Atualmente, o Brasil conta com mais de 320 agências marítimas estabelecidas em todos os portos do país, sendo 48 concentradas no Porto de Santos, o que evidencia a relevância econômica do segmento que gera milhares de empregos diretos no território nacional.
 
Na condição de mandatários e agindo por conta e ordem dos seus respectivos armadores-transportadores-mandantes, os agentes marítimos são responsáveis por desempenhar funções fundamentais de cunho administrativo e comercial perante os mais diversos órgãos públicos intervenientes e terceiros em cada porto de escala dos navios agenciados. Eles têm como finalidade obter autorizações para atracação e desatracação, supervisionar operações de carga e descarga de mercadorias, embarque e desembarque de tripulantes, além de emitir documentos comerciais ou destinados a autoridades anuentes, providenciar abastecimento de combustível e de suprimentos de bordo – dentre outras tarefas sem as quais a operação do navio para consecução da atividade fim do transporte marítimo, que é atender o frete contratado e viabilizar o comércio internacional, seria inviável.
 
Além das atribuições aqui já mencionadas, os agentes marítimos desempenham a função de inserir dados no sistema informatizado da Receita Federal, denominado Siscomex Carga (Siscarga), relativamente à movimentação de navios, cargas e unidades de cargas com origem ou destino nos portos brasileiros. Dentre as informações que devem ser inseridas no referido sistema, estão incluídos dados sobre escalas dos navios, tipo de operação, número de cada conhecimento marítimo, nomes de embarcadores e consignatários, descrição completa de todas as cargas existentes a bordo e respectivas nomenclaturas de classificação fiscal, entre outros detalhes, consoante estabelecido na IN 800/2007 da SRF.
 
Nos casos de descumprimento dos prazos fixados pela autoridade aduaneira para apresentação destes dados, retificação intempestiva ou divergência das informações prestadas, o agente marítimo torna-se passível de multas fixadas em R$ 5.000,00 por infração, nos termos da Lei 10.833 de 2003, o que, por si só, já tem gerado grande impacto negativo em face deste importante segmento que tem acumulado milhões de reais em penalidades do gênero nos últimos anos.
 
Além disso, o Artigo 76 da Lei 10.833 de 2003 estabelece sanções administrativas de advertência, suspensão e até cassação do registro dos agentes, além das já mencionadas multas pecuniárias. Nas hipóteses de atrasos por mais de 3 vezes, em um único mês, poderá ser aplicada a advertência. Havendo reincidência em conduta já sancionada com advertência, o agente marítimo poderá ser penalizado com suspensão das atividades pelo prazo de até 12 meses. Finalmente, poderá ser imposta a cassação do registro para o exercício da atividade de agente marítimo, caso este tenha acumulado suspensões que, em período de três anos, totalizem mais do que 12 meses.
 
Recentemente, a questão ganhou contornos ainda mais preocupantes. De forma até então inédita, seis agentes marítimos foram penalizados pela Alfândega do Porto de Santos com sanções administrativas de suspensão das respectivas atividades.
 
No entanto, muitas vezes as infrações são decorrentes de simples erro humano de digitação, ao passo que, na grande maioria dos casos, a infração cometida sequer carrega potencial de lesão ao controle fiscal e aduaneiro das embarcações e mercadorias circuladas no país ou de lesão aos interesses públicos.
 
Acrescente-se a isso o fato de que o agente marítimo depende de informações fornecidas por terceiros envolvidos na cadeia de transporte (importadores, exportadores, etc.), para então inserir os dados no sistema – sendo que muitas vezes as recebe com atraso ou divergências, ao passo que os prazos estabelecidos pela autoridade são extremamente exíguos.
 
Cabe também destacar que o agente marítimo de um navio de contêineres chega a inserir cerca de 10.000 dados no Siscarga em um único mês. Dentro desse universo, a média de registros efetuados com atraso é de apenas 0,004%, o que revela uma quantidade ínfima de infrações no período e demonstra flagrante desproporcionalidade entre a infração cometida e a respectiva penalidade.
 
Absolutamente, o espírito da lei não é inviabilizar a atividade do agente marítimo, mas apenas e tão somente evitar e reduzir o cometimento de tais infrações, tudo em benefício do controle aduaneiro de mercadorias e navios que circulam no País. No entanto, o agenciamento marítimo encontra-se sob grave ameaça no país, notadamente em razão da forma como estão sendo aplicadas as sanções administrativas. Embora a autoridade aduaneira esteja observando a “letra fria da lei”, penalidades como as recentes suspensões acabam por colocar em risco a continuidade da atividade dos agentes, o que, em última análise, acarreta risco a toda cadeia de logística e transporte marítimo de cargas. No fim do dia, tendo em vista a função essencial dos agentes marítimos como elo imprescindível para o fluxo da nossa corrente de comércio, toda a coletividade e os interesses nacionais estão sendo colocados em risco.
 
A problemática aqui colocada pode ser resolvida mediante a aplicação rígida do critério de proporcionalidade para imposição excepcional de sanções administrativas de advertência, suspensão e cassação mediante análise prévia da gravidade da conduta, natureza da infração e antecedentes do infrator, conforme estabelecem os parágrafos 4º e 5º-A, do Artigo 76 da Lei 10.833 de 2003.
 
Definitivamente, algo precisa ser feito nesse sentido e com urgência!

*Marcelo Sammarco é advogado, sócio do escritório Sammarco Advogados, mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Universidade Metropolitana de Santos, árbitro no Centro Brasileiro de Arbitragem Marítima (CBAM), diretor de marketing da Associação Brasileira de Direito Marítimo (ABDM), presidente da Comissão de Direito Marítimo da OAB – Subsecção de Santos, coordenador de Pós Graduação em Direito Marítimo na Universidade Metropolitana de Santos, conselheiro do comitê permanente do Fórum Sudeste Export, palestrante e articulista em temas relacionados ao direito marítimo, portuário e regulatório.
 

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