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Governo quer liberar R$ 15 bi do PIS/Pasep para aquecer a economia

Fonte: O Globo
 
Medida, ainda em estudo, valerá para pessoas de qualquer idade e recursos depositados até 1988
 
Sem os recursos das contas inativas do FGTS para turbinar o PIB, o governo está agora em busca de outros incentivos que não tenham impacto sobre as contas públicas. Em sua primeira entrevista exclusiva, o ministro do Planejamento, Esteves Colnago, afirmou ao GLOBO que a equipe econômica apoia uma proposta do Congresso de criar uma janela para que trabalhadores de qualquer idade saquem recursos do PIS/Pasep depositados até 1988. Segundo ele, isso pode injetar até R$ 15 bilhões na economia. Para Colnago, sem a reforma da Previdência, o teto de gastos fica insustentável já em 2020. Ele destacou ainda que a privatização da Eletrobras é importante não apenas para reforçar os cofres públicos. Sem recursos para aportar na estatal, “o governo hoje é um peso para a Eletrobras”, disse o ministro.
 
O teto de gastos é cada vez mais difícil de cumprir uma vez que não houve reforma da Previdência. Até quando ele é sustentável?
 
Sem reforma, já é muito difícil (cumprir o teto) em 2019 porque a despesa discricionária (que se pode cortar) está em R$ 98 bilhões, e é muito difícil os órgãos cortarem. Eu poderia zerar os investimentos, mas isso é uma coisa muito difícil de fazer porque, atualmente, tenho obras em andamento. Em 2019, dá para sobreviver? Dá. Mas em 2020 não dá. É preciso aprovar alguma reforma.
 
Mas mesmo 2019 fica muito apertado então...
 
É por isso que é muito importante aprovar o projeto da reoneração da folha. São R$ 16 bilhões de despesas que você poderia agregar nas discricionárias. Sairia de R$ 98 bilhões para R$ 114 bilhões. Mas não tem como não fazer uma reforma da Previdência. Ela daria uma economia de R$ 5 bilhões este ano. Assim, o ano de 2019 seria mais tranquilo. E num segundo ano, o ganho seria de R$ 14 bilhões.
 
Como ficará o adiamento do reajuste do funcionalismo?
 
Em 2019 temos um novo reajuste do funcionalismo. Podemos tentar, de novo, postergar.
 
O governo vai insistir no adiamento do reajuste de 2018 para 2019?
 
A cada mês que passa fica mais difícil. São criadas muitas dificuldades. Mas essa é uma carta que está na mesa.
 
O que mais o governo precisa para manter o Orçamento de 2019 dentro do teto?
 
Poderíamos repensar alguns órgãos. Transformar alguns órgãos em organização social. O ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) é um centro de excelência, ele poderia ser uma boa organização social e aí teria recursos da iniciativa privada e recursos do governo. Mas a folha seria fora do governo. O governo, atualmente, atravanca vários órgãos porque está em uma situação de fragilidade fiscal.
 
Como fica o investimento público nesse cenário? A tendência é que ele fique menor no ano que vem?
 
A tendência é que sim. Mas vai ser muito menor? Aí eu não sei.
 
O governo tem que detalhar, em agosto, quais despesas vai condicionar à aprovação de um crédito suplementar, de forma a não descumprir a regra de ouro. O que estará dentro desse crédito?
 
O governo pode botar as discricionárias, mas depende da magnitude (do descasamento da regra de ouro). Depois, são as despesas obrigatórias. A Constituição me permite fazer isso, colocar despesas obrigatórias como despesa condicionada.
 
E, dentro das despesas obrigatórias, existe alguma que seja uma alternativa?
 
A Previdência é o candidato natural porque ela vem mostrando um desequilíbrio. A gente vem falando da necessidade de reformar. Mas isso vai ser discutido até agosto.
 
O senhor não acha que a impopularidade da reforma da Previdência pode fazer com que seja mais fácil para o governo discutir a regra do teto do que fazer a reforma a partir de 2020?
 
Possível é. Mas, mesmo rediscutindo a regra do teto do gasto, a não aprovação da reforma da Previdência indica que o governo vai ter dificuldade de demonstrar solvência no médio prazo. Você pode até falar que não quer discutir Previdência e que vai eliminar o teto do gasto. O mercado vai ter uma leitura, a dívida vai crescer. Que Estado é esse que você vai ter? Normalmente, tudo se resolve em economia via inflação, que é o pior dos cenários. Há um desarranjo na economia, a população de menor renda é a que mais sofre e você posterga eventual crescimento da economia. Eu não vejo plano B para a reforma da Previdência. Vou aumentar a tributação? Até que ponto?
 
O que lhe preocupa, hoje, do ponto de vista da despesa?
 
O que mais me preocupa é que ainda não caiu a ficha de que o Estado, hoje, não pode tudo. O Estado tem sérias limitações para cumprir com as suas obrigações. Há uma demanda natural das pessoas de ter uma saúde melhor, educação melhor, transporte público com passagem menor. O desejo das pessoas é infinito. Mas o Estado chegou a um ponto em que não consegue mais atender isso. E ele tem tido dificuldade de demonstrar isso. Eu estou dando benefício há 20, 30 anos a alguns setores e nem assim esses setores têm demonstrado essa competitividade. Será que eu não posso realocar isso em outro local, mais alinhado com a economia de hoje em dia?
 
Mas isso é um problema que vocês têm com o Congresso…
 
Não só com o Congresso. Temos dentro do próprio Executivo. As pessoas entendem que o projeto delas é muito importante. Mas eu não tenho espaço. O governo precisa saber priorizar.
 
Bolsa Família entra nisso?
 
Entra como uma grande prioridade. Porque ele é muito bem dimensionado. Tem problemas? Tem pessoas que não deveriam estar lá? Tem, mas é bem feito.
 
Mas, dentro deste cenário, o senhor vê condições para aumento?
 
Estamos discutindo dentro do governo, adotando medidas de redução da despesa de outros programas e até do Bolsa Família. Esse olhar nos programas sociais pode gerar algum espaço. Para eu aumentar o benefício do Bolsa Família, tenho que ver de onde vou tirar.
 
O Banco Central divulgou o IBC-Br, e a taxa de crescimento veio abaixo do que o mercado estava esperando. Tem analistas revendo projeções de crescimento. O senhor continua otimista? Quando acende a luz amarela?
 
Estamos otimistas com o crescimento. Não se imagina a gente não crescer este ano. Pode crescer menos, mais próximo do nosso produto potencial, que seria 2,3%. Com relação ao sinal amarelo, estamos o tempo todo com o sinal amarelo, avaliando qual medida podemos adotar para que o mercado faça seus investimentos. Agora, por exemplo, estamos em uma discussão, junto com o relator do PIS/Pasep (senador Lasier Martins, PSD-RS), para permitir uma janela mais forte de eventuais saques para que esse recurso entre para abater dívida, para que as pessoas possam se reorganizar.
 
O que é uma janela forte?
 
O relator tem a ideia de criar um período em que as pessoas possam acessar a sua conta do PIS/Pasep antes de 1988, independentemente da idade. A regra normal era 70 anos ou aposentado. A gente diminuiu para 60 anos e agora estamos numa discussão com o relator. Ele apresentou uma proposta que diz que, por um período, independentemente da idade, se você tem saldo na conta, pode sacar. Isso pode gerar entre R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões. Isso vai resolver a economia? Não, mas pode ajudar.
 
E esse projeto que foi aprovado na Comissão de Assuntos Sociais que permite sacar o FGTS em caso de pedido de demissão?
 
No caso do FGTS a gente tem que olhar — eu gosto ideia — como é que isso pode impactar a sustentabilidade do próprio fundo. Hoje o FGTS é funding para vários setores da economia. Você tem que saber se aquilo ali, de alguma forma, iria comprometer a sustentabilidade do fundo no médio prazo.
 
Porque isso é uma forma de baratear o endividamento e de gerar atividade…
 
Sim. Ela pega aquele recurso, quita a dívida mais cara que ela tem e consegue caminhar normalmente na sua vida. Mas tem que ver. De toda forma a gente melhorou muito o FGTS. A gente já está distribuindo os resultados do FGTS, que não havia essa distribuição lá atrás. Foram medidas para poder tornar a remuneração dele um pouco melhor.
 
Tem algum outro projeto para incentivar a economia?
 
Estamos reiniciando a discussão com a Caixa Econômica e com a Febraban para ver se a gente consegue fazer caminhar o consignado privado. É o único que não deslanchou. No ano passado, a gente passou uma lei que permite que um pedaço do FGTS, tanto da multa numa eventual demissão quanto 10% do saldo da conta, pudesse ser utilizado como garantia num empréstimo de crédito consignado. Ela (a lei) está em vigor, mas não foi regulamentada. Os bancos têm que estar muito seguros de que, numa eventual demissão, terão acesso a um pedaço da multa e, mais importante, a um pedaço do saldo.
 
O que está se discutindo é a regulamentação?
 
Isso, com jurídico da Caixa e da Febraban, de como é que eu deixo apartado esse pedaço do saldo da conta. Dos R$ 100, R$ 10 é para pagar o consignado do banco “Y”. Como é que o banco vê isso? Tem que, de alguma forma, ter essa transparência.
 
Se hoje eu quiser usar o FGTS como garantia não posso ainda?
 
A multa sim, mas o saldo não. A multa é só se o trabalhador for demitido sem justa causa, talvez a empresa demore a depositar. Sai do risco trabalhador e passa a correr risco empresa. Pode ser melhor, mas não necessariamente é melhor. O saldo na conta, não. O risco é muito baixo. Isso pode ajudar bem.
 
Quão avançada está essa discussão da regulamentação?
 
Eu acho que está bem avançado. É difícil falar quando vai sair, porque temos tido essa discussão de uma forma intensa há pelo menos um ano.
 
Das 15 medidas que o governo apresentou como sendo a substituição da reforma da Previdência, o que o senhor acha que tem efetivamente condições de caminhar este ano?
 
Vamos brigar para ser tudo. Acho que a parte do Banco Central tem uma boa chance, tanto o depósito voluntário, quanto a autonomia do Banco Central; cadastro positivo, eu acho que sim; duplicata eletrônica, acho que está bem encaminhado, não tem muita resistência. A extinção do fundo soberano a gente vai ter que fazer, precisa passar pelo Congresso e a gente precisa por causa da regra de ouro. A desestatização da Eletrobras nós vamos fazer muita força, então, nós acreditamos que vá caminhar. E a Lei Geral de Telecomunicações ganhou um novo impulso no Senado, aparentemente vai caminhar.
 
Qual o tamanho do problema fiscal se não conseguir aprovar a privatização da Eletrobrás?
 
Os R$ 12,2 bilhões (decorrentes da privatização) já estão reservados. Em termos de Orçamento, a gente já estaria resolvido. Agora, muito mais importante que fiscal, o governo hoje é um peso para a Eletrobras. É uma empresa que precisa investir, não está participando dos últimos leilões. Ela precisa comprar maquinários para ter ganho de produtividade, e o governo vem segurando ela. Porque eu não tenho capacidade, eu não tenho condições de fazer aportes de capital lá. A continuidade do governo na Eletrobras é ruim para todo mundo no final. Você tem uma empresa que vai perdendo espaço, perdendo competitividade. Isso, de alguma forma, rebate na tarifa de energia. E eu deixo de ter um player que poderia ser global.
 

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