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Os problemas da MP 905

Fonte: O Estado de S. Paulo
 
Medida Provisória do Emprego Verde e Amarelo mistura assuntos e compromete o equilíbrio entre capital e trabalho que prevalece nos países democráticos
 
Baixada sob a justificativa de estimular a contratação de trabalhadores jovens de 18 a 29 anos e estimular empregos, a Medida Provisória (MP) do Emprego Verde e Amarelo (MP 905) não vem causando polêmica apenas por ter misturado diferentes assuntos num mesmo texto legal. Ela vem suscitando discussões também por causa do denominador comum desses assuntos, que é o favorecimento do empregador, comprometendo assim o equilíbrio entre capital e trabalho que prevalece nos países democráticos.
 
No caso dos empregados, a MP revogou 37 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e suprimiu dispositivos de 22 leis e decretos que versam sobre matérias trabalhistas e previdenciárias. Além de introduzir mudanças no vale-alimentação, ela abriu caminho para uma desregulamentação de mercado de trabalho, revogando a obrigatoriedade de registro para várias categorias profissionais – entre elas, as de atuário, sociólogo, jornalista, radialista e publicitário. A MP também revogou textos legais que disciplinam o exercício profissional de lavador de automóveis, estatísticos, químicos, bancários e portuários. E ainda propôs a taxação das gorjetas de garçons, para permitir ao proprietário do estabelecimento o recolhimento dos encargos previdenciários.
 
No caso dos empregadores, a MP torna menos rígidas algumas de suas obrigações. Entre outras inovações, ela modifica o modo de ação dos fiscais trabalhistas. Em vez de multar empresas com irregularidades, eles são estimulados a orientá-las para não persistir na ilegalidade. A MP também cria um novo tipo de fiscalização, chamado de “inspeção modelo”. Por meio dele, a fiscalização de uma empresa de um setor servirá como referência para que as demais tomem ciência do que os fiscais estão observando em suas operações. Ou seja, por meio do que a MP chama de “procedimento especial de ação fiscal”, os fiscais fornecerão a essas empresas as informações necessárias para que se regularizem, evitando assim que sejam multadas. Pela MP, a “empresa modelo” também não será autuada. “A atuação do Estado não pode ser só punitiva. A ideia da MP não é evitar multa, mas explicar ao setor como funciona a fiscalização”, afirma o secretário de Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Dalcolmo.
 
Além disso, a MP prevê a criação de mais uma instância recursal, antes da esfera judicial, para que as empresas possam contestar no plano administrativo as decisões tomadas pelos fiscais trabalhistas. A medida constava da MP da Liberdade Econômica, mas, por ser polêmica, foi derrubada durante sua tramitação no Legislativo. Apesar da oposição de centrais trabalhistas e associações de fiscais, o Ministério da Economia voltou a apresentá-la. Entre outros problemas dessa inovação, dois se destacam. Um é o formato da nova instância recursal, que será um órgão colegiado nos moldes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, integrado por representantes de empregados, empregadores e auditores “designados pelo Secretário Especial de Previdência e Trabalho”. A dúvida é com relação aos critérios a serem utilizados por essa “designação”. O segundo problema diz respeito à limitação de algumas competências dos fiscais. Pela MP, quando houver necessidade de decisão de embargo de alguma atividade de uma empresa, ela não poderá ser tomada por um auditor de forma isolada. A decisão caberá à autoridade máxima regional do Executivo, que é indicada por critérios mais políticos do que técnicos.
 
A modernização do Direito do Trabalho, que começou a ser feita com a reforma aprovada em 2017 pelo governo Temer, é uma das medidas fundamentais para reativar a economia brasileira. Mas, do modo açodado como está sendo feita desta vez, pela mistura de diferentes temas numa única MP e pelo rompimento do equilíbrio que deve prevalecer entre o capital e o trabalho, com o flagrante favorecimento de um lado e a precarização dos direitos do outro, ela pode ter efeitos opostos aos desejados, ampliando a insegurança jurídica e aumentando a judicialização no âmbito do trabalho.
 

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