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Tecon 10: Cade vê riscos de concentração, mas não crava modelo de disputa

Fonte: Agência iNFRA
 
O principal ponto de discórdia sobre o leilão do Tecon Santos 10 – o formato do certame, se será faseado ou não – foi analisado de forma contida pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) na nota técnica do órgão solicitada pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que avalia o projeto do megaterminal de contêineres projetado para o Porto de Santos.
 
O parecer (leia aqui), que diz haver possíveis “riscos” concorrenciais se uma das empresas que operam terminais de contêineres no porto assumir o Tecon, afirma também que esse potencial risco gerado pela concentração econômica não é uma condição suficiente para confirmar que ele, de fato, vai se concretizar em abuso de poder de mercado. Para o órgão antitruste, uma avaliação “definitiva” sobre a concessão do terminal demandaria que o Cade estivesse diante de uma situação concreta.
 
“Uma avaliação conclusiva sobre a determinação quanto a existência de um dano efetivo à concorrência, que justifique intervenção, dependeria integralmente de uma apreciação de caso concreto pelo Cade, com base em dados e evidências”, diz o parecer conjunto, assinado pelo chefe da SG (Superintendência-Geral), Alexandre Barreto, e pela economista-chefe do DEE (Departamento de Estudos Econômicos), Lilian Severino. 
 
Na nota técnica, o Cade afirma que o poder concedente possui autonomia para adotar as escolhas que “melhor considerar adequadas ao interesse público”. “(…) entende-se que a atuação do poder concedente se consolida como instrumento central para a harmonização entre as necessidades do setor portuário e os interesses coletivos, assegurando que as decisões adotadas não apenas promovam a eficiência e a competitividade, mas também fortaleçam a sustentabilidade e a modernização da infraestrutura, em consonância com o desenvolvimento econômico e social do país”, informa o parecer.
 
Os riscos concorrenciais apontados pelo órgão na nota técnica estão presentes no debate sobre o Tecon 10 desde que o projeto passou a ser modelado, ainda no governo passado. No parecer desta quarta-feira (24), o órgão antitruste citou riscos em relação à concentração horizontal quanto à vertical (quando um armador também controla a movimentação do terminal).
 
Na sobreposição horizontal, mencionou, por exemplo, o risco de haver menor pressão por redução de preços ou melhoria na qualidade dos serviços, além de barreiras de entrada. Sobre a integração vertical, apontou riscos relacionados ao fechamento de mercado de insumos (input foreclosure) e de clientes (customer foreclosure).
 
Diferentes órgãos que se debruçaram sobre o tema ao longo dos últimos anos concordaram que haveria uma concentração excessiva de mercado se uma das empresas que já movimenta contêineres em Santos arrematar o novo terminal, já que ele pode ampliar em 50% a capacidade do porto para esse segmento. No entanto, o grande ponto de discussão sempre foi como mitigar esse risco no modelo do leilão.
 
Na ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), responsável por definir o projeto enviado ao TCU, os estudos da área técnica sobre o leilão já apontavam o risco de concentração. O parecer setorial indicou que ele seria mitigado com a opção do vencedor, caso seja um dos controladores dos terminais de contêineres em Santos, se desfazer depois do leilão do ativo que já opera.
 
Mas a decisão da diretoria foi por fasear o certame: empresas que já estão no porto só podem disputar o ativo numa segunda fase, se não houver propostas de outras empresas na primeira etapa, e teriam que se desfazer dos ativos que operam hoje, caso vencessem a disputa.
 
Em parecer também enviado ao TCU, a Subsecretaria de Acompanhamento Econômico e Regulação do Ministério da Fazenda recomendou que o leilão seja feito numa única etapa, sendo desnecessário o faseamento se já há a opção de desinvestimento posterior, na avaliação do órgão. É também a posição inicial da auditoria especializada do tribunal de contas, que no entanto ainda espera respostas de outros órgãos para consolidar seu parecer.
 
Pela regra definida na ANTAQ, ficariam de fora da primeira etapa do leilão a MSC, Maersk, a Santos Brasil, que passou a ser controlada pelo armador CMA CGM, e a DP World. A avaliação no mercado é que as restrições como colocadas poderiam inclusive impedir outros grandes operadores, como a chinesa Cosco, que manifestou a integrantes do governo recentemente interesse em participar da disputa.
 
Outras operadoras internacionais são apontadas como possíveis participantes sem restrições. E empresas que já atuam no Brasil, a filipina ICTSI (International Container Terminal Services) e a brasileira JBS Terminais, têm demonstrado interesse no negócio, que é o maior investimento em terminais portuários da história do país, avaliado em mais de R$ 5 bilhões. 
 
Parecer agrada diferentes lados
 
Sem que o novo parecer do Cade tenha avançado muito sobre o aspecto do modelo do leilão, ambos os lados que disputam sobre qual deve ser a proposta enxergaram pontos positivos no documento do órgão antitruste. Numa ponta, as empresas que não estão em Santos e defendem o modelo escolhido pela ANTAQ destacaram o apontamento sobre os riscos concorrenciais e a competência do órgão regulador para definir o assunto.
 
Já quem quer concorrer pelo ativo e hoje estaria proibido numa primeira etapa recebeu positivamente a posição do órgão, especialmente pelo fato de o Cade ter afirmado que os potenciais riscos levantados não necessariamente se converteriam em condutas anticompetitivas, lembrando que em acórdão recente o TCU indicou que as restrições precisariam ser “exaustivamente justificadas”
 
“Portanto, não sendo possível confirmar, neste momento, os efeitos líquidos negativos à concorrência da participação dos atuais incumbentes do Porto de Santos, ainda assim, dentro do framework legal e regulatório vigente, seria possível a manutenção dessa vedação, que certamente resulta em diminuição da concorrência pelo mercado, porém, essa restrição poderia ser justificável por alguma outra fundamentação que não concorrencial”, diz um dos trechos da nota técnica.
 
Em outro momento, o documento faz uma avaliação mais específica sobre a participação das operadoras que hoje estão no porto em uma segunda etapa do leilão, condicionada ao desinvestimento se vencerem. Nesse ponto, a SG e o DEE dizem que a opção parece não atender aos princípios e diretrizes do Guia de Remédios Antitruste do Cade, em especial o princípio da proporcionalidade.
 
“Em especial, o princípio da proporcionalidade, em que o Cade recomenda que eventual intervenção deve ser no sentido de impor ações mitigadoras necessárias, adequadas e suficientes à efetiva reversão do potencial prejuízo à concorrência identificado. Essa proporcionalidade implica que se evite a adoção de remédios que ultrapassem o necessário para restaurar a concorrência no mercado”, afirma a nota técnica.
 
O trecho também levou a interpretações divergentes. Quem é contra o faseamento entendeu que, ao falar de proporcionalidade, o Cade teria indicado que não há motivação suficiente para excluir alguma empresa do leilão. Outra leitura, contudo, foi de que o órgão antitruste estaria indicando o caminho de uma simples vedação desses operadores, sem que eles possam participar mesmo sob a previsão do desinvestimento.
 
Hoje com operação no Rio de Janeiro (RJ) e em Suape (PE), a filipina ICTSI, defensora da posição da ANTAQ, afirmou em nota que a manifestação do Cade se apoia em “bases técnicas e jurisprudência consolidada, respeitando as competências da ANTAQ e decisões de política pública”. 
 
Já a Maersk, que atua no porto de Santos pelo terminal da BTP e em outros portos do país, declarou que a nota técnica da autoridade antitruste está alinhada a recentes decisões do Cade e aos entendimentos já manifestados por outros órgãos da Administração Pública “de que não há fundamentos que justifiquem a exclusão de operadores incumbentes ou verticalizados do leilão do Tecon Santos 10 (…) Conforme o próprio documento, tais restrições ‘violariam a proporcionalidade’ e o simples apontamento de riscos ‘não permite confirmar que se materializariam”.
 
As considerações do Cade se somarão a uma série de outros pareceres que estão subsidiando a tomada de decisão do TCU. No momento, o processo está na área técnica, que aguarda a posição do MPor (Ministério de Portos e Aeroportos) para concluir seu relatório e enviá-lo ao ministro Antonio Anastasia, relator do caso. O prazo da pasta acaba nesta sexta-feira (26). A decisão final sobre o modelo é do poder concedente, que é o ministério comandado por Silvio Costa Filho. Até o momento, a pasta tem dito que vai seguir a decisão da corte de contas.
 

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