Notícias

Gargalo de contêineres em Santos abre janela para São Sebastião

Fonte: Agência iNFRA
 
Atores do setor portuário querem aproveitar a estruturação do arrendamento do Porto de São Sebastião (SP) para colocar o ativo no mapa de opções para movimentação de contêineres no Brasil. Beneficiado por um canal de acesso com 25 metros de profundidade, hoje ele recebe especialmente cargas gerais, mas é visto como potencial porto para o mercado mais congestionado em termos de carga portuária, atualmente.
 
A atratividade para passar a movimentar contêineres se ancora em dois pontos principais: a profundidade do canal de acesso e a demanda reprimida em razão de gargalos nas operações dos portos mais próximos, especialmente o de Santos (SP) – que, embora seja o maior complexo portuário da América Latina, sofre com limitações na carga conteinerizada, enquanto o Tecon 10 não sai do papel e os investimentos no canal de acesso patinam. 
 
Por ora, os estudos do governo federal para o arrendamento, chamado de terminal SSB01, preveem a possibilidade de movimentação de granéis sólidos e cargas gerais e conteinerizadas. Mas a CDDS (Companhia das Docas de São Sebastião), empresa pública estadual que administra o ativo, tem identificado um interesse especial de investidores no potencial do empreendimento para movimentar contêineres. 
 
“É uma questão de fazer contas. Os candidatos que têm visitado o porto, participado das audiências, do market sound e entrevistados pela Infra S.A certamente já observaram isso”, disse, em entrevista à Agência iNFRA, o presidente da CDDS, Ernesto Sampaio.
 
Píer
 
Embora o canal de acesso em São Sebastião tenha profundidade de 25 metros, as operações não conseguem aproveitá-la integralmente porque, na área do porto, o total cai para cerca de 10 metros. Para viabilizar a entrada de embarcações com calado maior, sobretudo navios de contêiner, a construção de um píer é vista como prioritária. O empreendimento está previsto na modelagem de arrendamento do terminal, que ao todo projeta atrair R$ 660 milhões em investimentos. 
 
“Aí, sim, vamos poder receber esses navios de maior calado. Teríamos condições, a depender do investimento e desejo do futuro arrendatário, de receber os maiores navios do mundo”, disse Sampaio. Com isso, São Sebastião se colocaria em posição vantajosa perante Santos, que permite calados de somente até 14,5 metros.
 
O investimento previsto nos estudos da Infra S.A contempla a construção do píer projetado dentro do canal com dois berços de atracação. Para garantir a profundidade adequada e evitar o assoreamento, é necessário que a instalação ocorra no interior do canal, e não próximo à área terrestre do porto. Com essa medida, a profundidade do canal do píer poderá atingir até 15 metros.
 
Segundo a autoridade portuária de São Sebastião, a aplicação dos recursos previstos elimina a necessidade de dragagem de manutenção graças à profundidade natural do canal. “O capex é utilizado para alcançar um pico, uma profundidade natural, mas depois se dispensa o opex, que seria a manutenção dessa profundidade para permitir a entrada de navios com maior calado”, explicou Sampaio.
 
“Tímido”
 
Apesar da avaliação de que São Sebastião pode ser um ativo relevante na vazão da demanda por movimentação de contêineres, integrantes do setor acreditam que esse potencial é subaproveitado na modelagem em estudo pelo governo.
 
O apontamento é feito pelo ex-presidente da Docas de São Sebastião, Frederico Bussinger, que classificou o arrendamento proposto como “tímido”. Na sua avaliação, uma proposta mais abrangente, que incluísse outros terminais, teria um aproveitamento mais eficaz. 
 
O modelo atual, por exemplo, não contempla o armazenamento de contêineres. O terminal seria projetado apenas para carga e descarga, sem prever estrutura de armazenamento –algo que, segundo Bussinger, poderia ser compartilhado com o terminal logístico de São José dos Campos (SP).
 
“Isso [um arrendamento tímido] vai resolver o problema do gargalo? Não vai”, criticou Bussinger, que vê uma oportunidade desperdiçada e uma subutilização do canal disponível. “É um desperdício usar um canal com profundidade mínima de 25 metros para receber navios que não precisam disso. Não precisam de 25, nem de 20, nem de 15 metros”, apontou o engenheiro e economista. 
 
Entre outras vantagens de São Sebastião, ele lembra que o porto está localizado próximo a algumas das cinco melhores rodovias do Brasil, segundo especialistas: Dutra, Ayrton Senna, Dom Pedro e Tamoios.
 
“A ferrovia EF-480, que passa pela região, está sendo modernizada com a renovação do contrato da MRS Logística. Além disso, a presença de um aeroporto [São José dos Campos] contribui para que essa área ofereça condições altamente favoráveis ao desenvolvimento de uma plataforma logística –eu diria, em uma condição quase imbatível”, completou Bussinger. 
 
As condições do entorno de São Sebastião também foram destacadas pelo presidente da CDDS, com destaque para a Rodovia dos Tamoios e a previsão de um novo acesso exclusivo ao porto. Hoje, o porto movimenta cargas de açúcar, barrilha e coque de petróleo, que totalizaram cerca de 1,5 milhão de toneladas no ano passado. A expectativa é de que esse número no mínimo triplique com a nova operação projetada. 
 
“É um luxo. Poucos portos no país conseguem ter esse tipo de privilégio”, disse Sampaio. 
 
Próximos passos
 
A proposta de arrendamento do SSB01 passou por audiência pública na ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), em novembro de 2024. Desde então, as sugestões da consulta pública estão em análise pelo Ministério de Portos e Aeroportos e pela autarquia, em conjunto. 
 
À Agência iNFRA, a autarquia confirmou que a Secretaria Especial de Licitações e Concessões da agência está avaliando as sugestões e que, depois que o modelo for aprovado, seguirá para o TCU (Tribunal de Contas da União).
 
A expectativa é de que o leilão ocorra em dezembro deste ano, segundo o governo federal. As obras devem começar de dois a três anos após a assinatura do contrato. Pelo projeto atual, elas seriam realizadas numa área operacional de 262 mil metros quadrados. A movimentação, com isso, poderia chegar a um milhão de TEUs. 
 
Sampaio, da CDSS, lembra, no entanto, que durante a consulta pública a Infra S.A. já recebeu várias sugestões para ampliação da área. “Se a área for aumentada, a movimentação pode chegar a 1,5 milhão, 2 milhões de TEUs”, estimou.
 
Outras fontes do setor ouvidas pela Agência iNFRA são mais cautelosas sobre o potencial do porto em disputar cargas que hoje prioritariamente vão para Santos e outros portos maiores. Porém, diante do ainda incerto e já conflituoso edital do Tecon 10 de Santos, grandes empresas já estão avaliando a unidade como uma possibilidade.  
 
O presidente da CDDS reconhece que, se o terminal se voltar para a movimentação de contêineres, a virada de chave não será da noite para o dia. “Ah, se há uma demanda reprimida de 1 milhão de TEUs em Santos, no dia seguinte, quando cortar a fita do porto aqui, esse 1 milhão de TEUs vai passar pro porto de São Sebastião. Não, não vai acontecer dessa forma”, pontuou.
 
Vasta gama
 
Em nota à Agência iNFRA, o secretário de Portos, Alex Ávila, ressaltou a vasta gama de possibilidades para a ampliação da oferta de capacidade do porto em “vários segmentos de cargas”, ressaltando, ainda, que o ativo tem características “específicas e privilegiadas”.
 
Avila reforçou que o projeto em desenvolvimento prevê um terminal multipropósito, no qual o empreendedor pode decidir o segmento de cargas e até mesmo optar por um condomínio com múltiplos tipos de operações.
 
“Os investimentos previstos, de mais de R$ 2,8 bilhões, preveem ampliação de capacidade de atracação com novos berços e também áreas de retaguarda para transformar o porto em um grande movimentador de cargas de alto valor agregado”, disse.
 

Imprimir Indicar Comentar

Comentários (0)



Compartilhe



Voltar