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Túnel Santos-Guarujá vai projetar a Baixada Santista e o Brasil para o mundo inteiro, diz especialista

Fonte: A Tribuna On-line
 
Em entrevista exclusiva, Jennyfer Tsai analisa os desafios e oportunidades das obras no Porto de Santos, defende planejamento antecipado e destaca o impacto logístico do túnel submerso entre Santos e Guarujá
 
As obras estruturantes são essenciais no sistema portuário, sejam elas infraestruturas de acesso, de cais ou de armazenagem de cargas. E o caminho da infraestrutura até a eficiência logística, operacional e de gestão nos portos envolve vencer uma série de etapas.
 
Para falar sobre esse complexo percurso, A Tribuna entrevistou a engenheira civil e diretora-executiva da Flow Assessoria e Gestão Empresarial, Jennyfer Tsai, que também foi diretora de Infraestrutura na Autoridade Portuária de Santos (APS), no período de 2019 a 2020. A especialista avalia que a obra do túnel Santos-Guarujá projetará mundialmente a Baixada Santista e o Brasil.
 
Quais são os tipos de obras de infraestrutura portuária?
 
Pode-se dizer que temos basicamente três grupos. São as obras de acessos rodoviário, ferroviário, aquaviário e dutoviário; obras de estruturas de acostagem de navios, como cais e píer, e obras de estruturas de armazenagem de cargas, como silos, tanques, pátios, edifícios e garagem. No caso de Santos, temos ainda o terminal de cruzeiros, que demanda uma infraestrutura para embarque e desembarque de turistas e tripulação.
 
Uma obra de infraestrutura portuária deve ser planejada com quanto tempo de antecedência?
 
A gente tem um instrumento de planejamento portuário que é o plano mestre. O do Porto de Santos foi publicado em 2019 e contém ações de planejamento de curto, médio e longo prazos. O curto prazo é de até quatro anos, o médio varia de quatro a dez anos e o longo é superior a dez anos.
 
Diversos parâmetros devem ser considerados para a elaboração de um planejamento de obra de infraestrutura. Quanto mais parâmetros tivermos para cada tipo de projeto, mais frentes de trabalho. Portanto, melhor se for planejado com a maior antecedência possível. Eventualmente, alguns projetos encontram condições de contorno favoráveis e são rapidamente colocados em execução, não demandando tanta antecedência.
 
Pode citar alguns projetos?
 
O corredor logístico de celulose no Macuco e o terminal de granéis sólidos no Paquetá (Cofco) são dois projetos recentes, no Porto de Santos, que foram rapidamente tirados do papel.
 
O que precisa ser considerado nesse planejamento?
 
Os aspectos exógenos (externos) e endógenos (internos) ao projeto e seus respectivos prazos. Entende-se por exógenos a obtenção de licenças ambientais, autorizações e permissões de órgãos e entidades envolvidas. Pode haver ainda demanda por fornecimento de infraestrutura comum, por exemplo, um terminal que demanda acesso rodoferroviário ou melhoria no acesso aquaviário.
 
Esses investimentos se qualificam como aspectos exógenos quando não são realizados pelo empreendedor, mas por concessionárias de serviço público como rede de energia, de rodovia ou até pela Autoridade Portuária ou governos Federal, Estadual e Municipal.
 
Já aspectos endógenos são aqueles relacionados à complexidade da engenharia do projeto, aos recursos como mão de obra, materiais, equipamentos e produtividades do trabalho, sendo que esse último aspecto pode ser crítico ao planejamento quando se tratar, por exemplo, de uma implantação ocorrendo simultaneamente com uma operação portuária.
 
Quais são os principais entraves?
 
O histórico de obras portuárias em Santos demonstra que os principais entraves estão nos aspectos exógenos, principalmente aqueles que demandam iniciativas que não são do próprio empreendedor. Nos últimos anos foi possível notar, em Santos, investimentos não sendo realizados no prazo previsto por atrasos em licenciamento ambiental e autorizações de órgãos pertinentes. Além disso, indefinições quanto ao provimento de infraestrutura comum podem trazer riscos elevados à concretização do projeto.
 
Quais são as principais burocracias nos processos licitatórios?
 
Tratando-se de recursos públicos, as burocracias nos processos licitatórios são necessárias conforme estabelecido pelas regulamentações, pois garantem a governança necessária ao rito. Mas intercorrências do processo licitatório são comuns e costumam atrasar a conclusão da licitação como, por exemplo, judicializações por parte dos concorrentes.
 
É possível otimizar os prazos nos certames licitatórios?
 
A nova Lei das Licitações (14.133/2021) trouxe uma série de otimizações e inovações para contratações públicas que poderiam ser observadas por empresas estatais, tais como a APS, enquanto a própria Lei das Estatais (13.303/2016) não é atualizada.
 
Um exemplo de inovação é o diálogo competitivo, uma modalidade de licitação que se caracteriza por um processo de diálogo entre a administração pública e os licitantes previamente selecionados para desenvolver a melhor solução para uma necessidade específica. Este diálogo visa identificar alternativas inovadoras e adequadas que possam ser posteriormente apresentadas como propostas finais na fase competitiva.
 
O que precisa mudar para otimizar o tempo de planejamento e execução de uma obra?
 
A real necessidade do empreendedor do setor portuário atualmente é ter garantias de que as ações para o planejamento e execução estão sendo tomadas.
 
Por exemplo, se existe a necessidade de melhorar os acessos ao porto, seja terrestre ou aquaviário, todos os envolvidos na melhoria desses acessos estão de fato trabalhando para que as obras sejam efetivadas no prazo necessário? O que posso observar é que ainda existe uma incerteza em relação à responsabilidade de determinadas obras e, desse modo, o planejamento e execução acabam ficando fragilizados.
 
Como é calculado o orçamento de uma obra e como é feita a gestão orçamentária?
 
O orçamento de uma obra é calculado com base em um projeto de engenharia. Fazemos o orçamento a partir de tabela oficial e pesquisa de mercado. E essa gestão orçamentária é feita a partir de um cronograma físico-financeiro de obras.
 
Poderia citar uma obra bem-sucedida do planejamento à execução?
 
Em geral, as obras dos terminais arrendados e terminais privados.
 
Qual é a sua avaliação do projeto do túnel Santos-Guarujá?
 
É um projeto desafiador que colocará a Baixada Santista no mapa mundial de grandes obras, principalmente porque cruzará um canal portuário da representatividade que tem o canal do Porto de Santos. É possível perceber que representantes dos governos do Estado, Federal e Municipal, além da Autoridade Portuária, frente parlamentar e outras autoridades têm unido esforços em torno de mapear os próximos passos pós-leilão para garantir que o projeto tenha o menor desvio de prazo possível.
 
O túnel é uma infraestrutura complexa que demandará uma operação complexa?
 
Pela relevância do projeto muito há o que se avaliar, estudar e planejar. Por exemplo, é possível antecipar quais as melhores janelas para que a navegação no canal seja interrompida? Essas janelas podem, desde já, ser alinhadas junto aos operadores portuários para que cada um possa estudar melhores maneiras de minimizar o impacto dessas interrupções em suas respectivas cadeias logísticas? É possível prever um ordenamento alternativo na fila de navios, uma vez que as interrupções podem afetar parte dos terminais?
 

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