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Com informalidade, 5 setores têm mais ocupados que antes da recessão

Fonte: Valor Econômico
 
A crise econômica que jogou milhões de pessoas na informalidade mudou também a composição do emprego por setor na economia. Em cinco grupamentos de atividade acompanhados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de ocupados superou o registrado no período imediatamente anterior à recessão, com destaque para alimentação e transporte. Foram esses segmentos que receberam parte dos trabalhadores que perderam seus empregos e agora têm uma população ocupada maior que em 2014. 
 
Essa recuperação relativa passa longe da indústria e da construção civil, que cortaram milhões de vagas e ainda têm um número de ocupados bem abaixo daquele ano. 
 
Segundo dados da Pnad Contínua trimestral, do IBGE, a construção civil perdeu 1,25 milhão de trabalhadores na comparação com segundo trimestre deste ano com o mesmo período de 2014. Uma queda de 16% no total de ocupados no setor. A indústria demitiu também 1,25 milhão (-9,5%), a agropecuária, outro 1,27 milhão (-13%). Neste último caso, a queda tem a ver também com o aumento de absorção de tecnologia pelo setor.
 
Na ponta oposta, o segmento de alojamento e alimentação teve no segundo trimestre deste ano um acréscimo de 1,1 milhão de trabalhadores em relação a quatro anos atrás, num aumento expressivo de 26%. Transporte aumentou seu contingente de ocupados em 9,6%, ou 409 mil pessoas. Outros serviços tinham 607 mil empregados a mais, um aumento de 15% sobre 2014. O serviço doméstico agregou mais 234 mil trabalhadores, num aumento de 4% sobre 2014. O grupo que inclui administração pública, educação, saúde e defesa ganhou mais 990 mil empregados, com aumento de 6,5% no total de empregados.
 
Completando os dez grupamentos de atividade acompanhados pelo IBGE, comércio e reparação de veículos têm praticamente o mesmo número de ocupados de quatro anos atrás e o setor financeiro, imobiliário e de administração perdeu 357 mil empregados, ou 3,5% do total de 2014.
 
 
Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, diz que o aumento da ocupação em segmentos como alimentação, transportes e outros serviços (manicure, cabelereiro, manutenção, etc) está relacionado ao trabalho sem carteira assinada. "São os segmentos mais aderentes à informalidade. Parte deles é empregado sem carteira ou por conta própria. Trabalhar com alimentos, como ambulante, é uma das primeiras válvulas de escape para quem perdeu o emprego. Nos transportes, o aumento coincide com a entrada dos aplicativos no Brasil", diz. 
 
É o que o economista Nelson Marconi, da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EAESP-FGV), chamou de "economia das quentinhas". "Setores como a indústria perdem participação na ocupação, enquanto outros, como alojamento e alimentação, que pagam menores salários, contratam proporcionalmente mais. É a economia das quentinhas, a solução de última instância, porque sempre haverá demanda por elas", escreveu ele em artigo na revista "Conjuntura Econômica", do Ibre-FGV.
 
Um dos efeitos dessa mudança no mercado de trabalho, além da falta de estabilidade e benefícios sociais como Previdência, seguro-desemprego e FGTS, é a queda de renda nos segmentos que viram seu contingente de trabalhadores aumentar. Segundo dados do IBGE, ao aumento de 26% no número de trabalhadores em alimentação e alojamento, correspondeu uma queda de 9% na renda média em termos reais no segundo trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. Em transportes e outros serviços, o recuo foi de 9,5%. Na indústria, houve aumento de 2,6%. Na construção, setor atingido pela crise e pela Lava-Jato, além da perda de vagas o salário médio caiu 9,4%.
 
Com a recuperação muito lenta da economia, é improvável que indústria e construção retomem os números pré-crise tão cedo. "O emprego na construção vai aumentar na medida em que houver estabilidade, quando a população se sentir segura para investir em imóveis e houver a volta dos investimentos em infraestrutura. A indústria sofre com o poder de compra mais baixo", diz Azeredo. "O que depende do aumento da massa de renda, de carteira de trabalho, de um cenário político mais estável, sofre mais. Visto de outra forma, perdemos quatro milhões de vagas de trabalho formal e até hoje não houve recuperação", afirmou, acrescentando que a queda do emprego formal desacelerou, mas não acabou.
 
O técnico do IBGE observa que o mercado de trabalho está preso a um círculo vicioso: a falta de estabilidade e os baixos salários geram menos consumo, que gera menos atividade, que gera menos emprego.  
 
Azeredo ainda cita o que para ele é o efeito mais perverso dessa ciranda: a subutilização e o desalento. "Há toda uma população que, embora ocupada, está subutilizada e quer trabalhar mais", diz, referindo-se a cinco milhões de pessoas que trabalham menos de 40 horas por semana. Há ainda outras oito milhões que estão fora da força, mas gostariam de obter uma ocupação; 60% delas estão no desalento (desistiram de procurar emprego) e que, segundo Azeredo, dá a falsa ideia de queda do desemprego. Junto a mais de 13 milhões de desempregados, o total é de 27 milhões de pessoas subutilizadas.
 
Para Marconi, o aumento da participação de empregados com carteira no mercado de trabalho passa pela recuperação da economia e, em menor grau, pela redução do encargo sobre a folha das empresas. E ainda é preciso melhorar a estrutura produtiva e uma política educacional que melhore a qualificação dos trabalhadores, diz.
 
Na indústria, um setor que tradicionalmente gera mais emprego formal, as perspectivas ainda não melhoraram. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) entre maio e junho o setor cortou quase 27 mil empregos com carteira assinada, após quatro meses de saldos positivos. A greve dos caminhoneiros pode ter influenciado, mas para o diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Julio Gomes de Almeida, a situação frágil da indústria vai além dos efeitos da greve. Há crescimento lento de produção, mas as exportações de manufaturados, que deram fôlego ao setor algum tempo atrás, caem há três meses. Ele avalia que a greve de maio pesou nas expectativas. "Há falta de confiança e a cautela se reflete nos investimentos e no emprego", diz.
 

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