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29/08/2024 - 11h09

Cade abre inquérito contra manobristas de navios no Porto de Santos


Fonte: Folha de S. Paulo - Painel S.A.
 
Conselho avalia que práticos são profissionais liberais que não deveriam ser submetidos ao tabelamento de preços por um sindicato
 
A Superintendência-Geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) autorizou nesta quarta (28) a instauração de inquérito administrativo para apurar infrações e condutas anticoncorrenciais de manobristas de navios (práticos) no porto de Santos.
 
O órgão já havia instaurado, há um ano, um procedimento preparatório para averiguar denúncias contra a formação de cartel de um grupo de 600 pilotos que estacionam navios no porto.
 
Eles chegam a ganhar, em média, R$ 300 mil por mês.
 
São alvo das investigações o Sindicato dos Práticos dos Portos de São Paulo (Sindipraticos) e a Coordenação Geral dos Serviços de Praticagem da ZP-16, entidade sem fins lucrativos que congrega os práticos da ativa na região.
 
Desde que foram notificados, os órgãos de representação dos práticos enviaram uma série de documentos relacionados à atuação dos profissionais no porto.
 
Em um deles, o Cade destacou o contrato "acordo de valores, serviços e condições de praticagem", que estabeleciam valores mínimos referenciais a serem cobrados pelos associados da PraticosZP16.
 
Para o conselho, no entanto, os práticos são profissionais liberais que prestam serviços por meio de contratação direta através de sociedades limitadas unipessoais.
 
Por estarem amparados pelas regras da livre iniciativa, os práticos deveriam competir entre si na prestação de serviços mais eficientes ou econômicos e não deveriam ser submetidos ao tabelamento de preços por entidades sindicais ou associativas.
 
"Trata-se de um mercado em que há a contratação direta do prestador pelo tomador para que seja realizado um serviço específico. Portanto, essa negociação conjunta apresenta indícios de conduta concertada para convergência de preços entre prestadores potencialmente concorrentes, fato esse a ser melhor investigado por esta SG/Cade", afirma o Cade.
 
Agora, o caso será analisado pelo Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), formado pelo Cade e pela Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência, órgão ligado ao Ministério da Fazenda.
 
Como mostrou o Painel S.A. em novembro, representantes do agronegócio, indústria e transportes reclamavam que o governo permitiu a aprovação, na Câmara dos Deputados e, posteriormente, no Senado, de um projeto de lei para manter o monopólio dos práticos.
 
Para eles, o esquema de rodízio dos práticos nas manobras dos navios impede a concorrência. Seria necessária uma regulação econômica permanente para a atividade, por órgão com experiência de coibir abusos, algo barrado pelo projeto de lei.
 
O texto, que tramitou em tempo recorde no Congresso e foi aprovado no final do ano, estabeleceu que a fixação de preço só será feita mediante provocação, em caráter extraordinário, excepcional e temporário no limite de 12 meses prorrogável por igual período e pela Marinha.
 
Outro lado
 
A Praticagem do Brasil, associação que representa a categoria, afirma que o modelo de atendimento no país segue padrão mundial em razão da segurança da navegação.
 
"Países que implantaram a concorrência na atividade viram a disputa comercial entre práticos diminuir a qualidade do serviço e recuaram após acidentes graves", disse em nota.
 
"Apesar de ser um serviço prestado em regime de exclusividade no mundo inteiro, a nova Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lei 14.813/24), sancionada no início do ano, assegura instrumentos regulatórios eficientes sobre as partes técnica e econômica."
 
O grupo informa que o preço do serviço é livremente negociado com os armadores. Caso haja divergência entre as partes, seja por defasagem do preço ou abuso de poder econômico, o valor pode ser fixado, em caráter extraordinário, excepcional e temporário pela Autoridade Marítima (regulador).
 
O texto da nova lei foi aprovado após processo de quatro anos de fiscalização do arranjo institucional da praticagem pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
 
O TCU concluiu que "a regulamentação técnica exercida pela Autoridade Marítima, com a consequente instituição da escala de rodízio única (de atendimento), não caracteriza infração à ordem econômica, tendo em vista ser decorrência da ordem jurídica vigente".
 
"A matéria foi ainda fruto de ampla discussão técnica e jurídica tanto na Câmara quanto no Senado, no período de abril de 2022 a dezembro de 2023. Dezenas de entidades foram ouvidas pelos parlamentares, sendo o texto aprovado por unanimidade nas duas Casas."