Fonte: Agência iNFRA / Adalberto Santos de Vasconcelos*
Naquele contexto havia verdadeira batalha de narrativas sobre a questão em torno da licitação do terminal para movimentação e armazenagem de cargas conteinerizadas no porto de Santos (SP) denominado STS10.
Na ocasião, se observava, em linhas gerais, acentuada preocupação com a participação no certame da empresa BTP (Brasil Terminais Portuários S.A.), joint-venture formada pelos operadores portuários TIL (
Terminal Investment Limited) e
APM Terminals – líderes do mercado mundial de movimentação de contêineres – controladas pelas companhias de navegação pertencentes aos conglomerados econômicos MSC e Maersk, respectivamente.
Já na ocasião, a ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), diante dos diversos cenários hipotéticos analisados no mercado atinente ao porto de Santos, destacava a importância do “incremento da capacidade dinâmica de movimentação e armazenagem de contêineres em virtude da outorga do STS10”.
A agência asseverava que “o arrendamento do terminal STS10 mostra-se imprescindível para se reestabelecer o ambiente competitivo saudável entre os terminais portuários no Porto de Santos”
[1]. Ao que parece, esse cenário não se alterou.
Ao longo do processo de modernização do setor portuário, inaugurado pela então Lei 8.630/1993, passando pela Lei 12.815/2013, presencia-se reconhecido amadurecimento e aperfeiçoamento das instituições que definem as políticas públicas e desenvolvem os mecanismos de planejamento setorial, bem cono estruturam o arcabouço regulatório desse importante setor imprescindível para alavancar o desenvolvimento sustentável e competitivo do Brasil.
É nesse contexto que me causou surpresa – diga-se, estranheza – a mudança da política pública – ou orientação ministerial – acerca do processo de licitação do STS10.
O ponto relevante diz respeito ao esgotamento da capacidade de movimentação de contêineres no principal porto do país, a médio e longo prazo, caso não se licite urgentemente o STS10, cujo processo de licitação se prolonga por mais de dois anos.
Veja-se que a SNPTA (Secretaria Nacional de Portos e Transportes Aquaviários) aprovou os Evtea (Estudos de Viabilidade Técnica, Econômico-financeiro e Ambiental) em 24 de dezembro de 2021. Sendo que ANTAQ, por meio do Acórdão 553, de 31 de outubro de 2022, aprovou a análise das contribuições objeto da Audiência Pública 6/2022, com ressalvas sanáveis.
Nos últimos anos, verifica-se que a operação portuária no Brasil, em linha com as transformações mundiais observadas, vivenciou período de grande expansão. Nesse sentido, a consolidação no mercado de movimentação e armazenagem de cargas conteinerizadas tem se tornado o padrão nos principais portos do mundo.
Esse movimento vem a atender às mudanças, sobretudo tecnológicas, introduzidas no setor portuário que propiciam a utilização de embarcações cada vez maiores. O aludido processo, conhecido como “jumborização”, tem trazido inquestionável economias de escala e de escopo.
Por conseguinte, a “jumborização” das embarcações também tem reflexos sobre os terminais portuários, os quais necessitam passar por adaptações, como ampliação de berço de atracagem e de armazenagem, além de demandarem maiores investimentos em equipamentos de embarque, desembarque e movimentação de contêineres, dentre outros.
É nesse contexto que ganha relevância a licitação do STS10 para movimentação de contêineres, ou seja, é imprescindível para o desenvolvimento sustentável e competitivo do país ter, no principal porto do Brasil, outro terminal que desafogue o estrangulamento de movimentação de cargas conteinerizadas. Portanto, é urgente e necessário não retroceder para alavancar os investimentos no setor portuário.
O relatório da unidade técnica do TCU, de acordo com a citada reportagem da Agência iNFRA, corrobora, em princípio, o entendimento aqui esboçado, ao apontar que o atraso na implantação do terminal do STS10, na área do Saboó, “pode gerar ‘estrangulamento futuro da infraestrutura do porto’ e ‘prejuízos ao consumidor’”.
Relevante, ainda, destacar que a demora em licitar o STS10 acarreta outros prejuízos diversos, tais como a perda de receitas provenientes das outorgas de arrendamento ou a perda de benefícios econômicos decorrentes da redução de custos nos terminais e fretes associados à redução das filas dos navios para aportar em Santos.
Além dessas perdas, os cofres públicos estão deixando de arrecadar, nesses mais de dois anos de atraso para realizar a licitação, significativo montante de recursos provenientes de tributos pela utilização da área destinada – cerca de 500 mil m² – para implantação do STS10, que certamente poderiam trazer vários benefícios para o porto.
Mudanças em políticas públicas são legítimas, mas não podem contrapor fatos e ensejarem retrocessos. É exatamente nesse sentido que a alteração da diretriz política acerca da condução do processo licitatório do arrendamento do STS10 causa grande preocupação com o futuro do porto de Santos, sobretudo quanto à sua competividade, ao não serem adotadas as medidas cabíveis – já em curso, aprovadas por autoridades pertinentes e avaliadas pelo TCU – com o fito de evitar o estrangulamento da capacidade de movimentação de contêineres do principal porto nacional a médio e longo prazo.
[1] Nota Técnica nº 216/2021/CGMP-SNPTA/DNOP/SNPTA, de 24 de dezembro de 2021.
*Adalberto Santos de Vasconcelos é CEO da ASV Infra Partners Consultoria em Infraestrutura.