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06/01/2023 - 11h49

Excelência técnica para decidir sobre o futuro Porto Rei Pelé


Fonte: A Tribuna On-line / Gesner Oliveira*
 
O anúncio recente da desistência de continuar o processo de concessão parece precipitado
 
O Porto de Santos é o mais importante do Brasil, o segundo maior da América do Latina (atrás apenas do Panamá), o primeiro na América do Sul e o 41º do mundo. Até novembro de 2022, o complexo bateu o recorde de toneladas movimentadas (150,4 milhões), representando quase 30% das trocas comerciais brasileiras.
 
Dada a sua importância, a necessidade de investimento para manutenção e melhoria da estrutura e da capacidade do Porto é constante. Também é necessário que a gestão do complexo esteja sempre em linha com as melhores práticas de governança e com a capacidade de adaptação e velocidade para se adequar às demandas internacionais. Daí a vantagem de ter à frente da administração portuária a iniciativa privada, tipicamente mais ágil para captar recursos e gerir projetos de investimento.
 
O projeto de concessão do Porto de Santos já passou pela fase de estudos realizada pelo BNDES. Depois desta etapa, realizou-se consulta pública e é aguardado um parecer do Tribunal de Contas de União para a publicação do edital e agendamento do leilão. Somente depois de todas estas etapas, há a assinatura do contrato. Como em qualquer processo de transferência de direitos de exploração de serviços pelo setor privado, é imperativo respeitar as boas práticas de governança e publicidade, assegurando máxima transparência e competição.
 
O processo tem o potencial de mobilizar cerca de R$ 18 bilhões. Neste valor está incluída a ligação seca Santos-Guarujá, estimada em R$ 2,99 bilhões. Além de R$ 14,16 bilhões para manutenção do porto e R$ 1,4 bilhão de despesas de capital (Capex), conforme informações do BNDES.
 
O anúncio recente da desistência de continuar o processo de concessão do Porto parece precipitado. Uma decisão dessa natureza, após um longo processo de estudos e discussões, deveria ser precedida de análise criteriosa e não baseada em uma aparente postura ideológica.
 
Do ponto de vista técnico, os dados e os indicadores sugerem uma outra decisão. Se o Estado fosse realizar o potencial de investimento envolvido – algo improvável diante da situação fiscal –, os recursos são equivalentes a pouco mais de um mês do orçamento do Bolsa Família pagos para cerca de 40 milhões de pessoas no Brasil. Não parece mais inteligente deixar o setor privado investir e destinar os recursos públicos para programas sociais?
 
Por outro lado, se os investimentos não forem realizados, o País perde competitividade, renda e emprego. Não apenas isso, mas a queda de produtividade da mão de obra em um amplo conjunto de segmentos que dependem do complexo portuário significa menores salários.
 
Há também uma necessidade de gestão mais dinâmica e com respostas rápidas às constantes transformações do comércio internacional. O Estado é mais lento e burocrático, além de a Administração Portuária estar sujeitas às oscilações dos ciclos políticos que não necessariamente, ou quase nunca, coincidem com as demandas da boa gestão.
 
Se o projeto de concessão for bem desenhado e o Estado cumprir as funções regulatórias, não é preciso um “leviatã” para gerir o Porto. A visão de um estado onipresente está ultrapassada e não deveria reger decisões importantes das quais depende um salto de desenvolvimento de Santos e do Brasil. Algo que esteja à altura do Rei do Futebol, que deve emprestar seu nome ao Porto de Santos.

*Gesner Oliveira, economista, professor e coordenador do Centro de Infraestrutura e Soluções Ambientais da FGV