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23/11/2022 - 11h59

Nada mais permanente na vida do que uma gambiarra provisória


Fonte: A Tribuna On-line / Maxwell Rodrigues*
 
É preciso entender que gargalos logísticos e infraestrutura de acessos não são problemas de político. São de todos.
 
O comércio mundial cresce, o porto bate recordes atrás de recordes, os profissionais cada vez mais em busca de preparação para os desafios futuros, as empresas adaptando seus negócios ao universo disruptivo e o canal de navegação, mesmo com limitações, começa a receber navios gigantes.
 
O porto comemora e a cidade também. Em sua primeira atracação, a passagem do navio gigante vira evento, onde centenas de pessoas param na Ponta da Praia para tirar fotos e gravar vídeos. As mídias sociais são inundadas sobre um navio gigante chegando ao Porto de Santos.
 
Que orgulho para o nosso porto, para o Brasil e para a nossa região. Os munícipes elogiam a eficiência do porto em um momento marcante de sua história. Muito se falou e debateu sobre esse assunto, navio gigante, e o tão sonhado dia chegou.
 
O porto demonstra mais uma vez que ele não para e que está sempre pronto aos desafios impostos pelas operações e para atender a logística mundial que muda e cresce a cada ano.
 
Por outro lado, se o porto não para, a travessia de balsa para. Após três atracações de gigantes, as pessoas começam a ser afetadas pelas paralisações da balsa em seu cotidiano. Um problema crônico, de décadas e que dessa vez afeta novamente a rotina das pessoas e do maior porto do Hemisfério Sul. A cada atracação a travessia entre Santos e Guarujá fica paralisada em torno de 2 horas.
 
O Porto de Santos, com total responsabilidade, já anunciava a chegada desses gigantes em nossa região, uma necessidade premente dos negócios e do mundo atual. Contudo, promessas e discussões continuaram no âmbito das especulações quanto à construção de um túnel entre as duas margens. Como rotineiramente estamos acostumados, o tema faz parte do script político dos que almejam cargos na federação, no Estado ou no município. Confesso que acreditei fielmente que dessa vez teríamos esse projeto saindo do papel.
 
Alguns ainda continuam esperançosos de que possa ocorrer com a desestatização do Porto de Santos, algo que perdeu força diante do resultado das últimas eleições. Outros afirmam fortemente que a desestatização não ocorrerá e com isso a ligação irá naufragar novamente.
 
No mantra do porto com a cidade é justo entender que a cada dia o porto se empenha em fazer seu papel, gerando riqueza e empregos para a região. É preciso entender definitivamente que gargalos logísticos e infraestrutura de acessos não são problema de político, do porto ou da cidade. São de todos. Estes temas não devem vir mais à tona somente em períodos de eleição e devem ser agenda permanente dos políticos, do porto e da cidade.
 
A travessia entre Santos e Guarujá, via balsa, é um transtorno para os moradores da nossa região, turistas, trabalhadores e todos que dependem de um sistema que não atende a demanda. Não só por conta da passagem de navios gigantes, mas principalmente porque interfere na vida de milhares de pessoas. É um problema com o qual convivemos há décadas e a cada dia se torna maior.
 
Não existe nada mais permanente na vida do que uma gambiarra provisória. A balsa quebra, precisa de manutenção, depende da maré para operar, para com a neblina, usa as vias da cidade para suas filas, dentre tantas outras condições. Convivemos com a impressão de que todos os improvisos feitos até então na travessia são normais e nos condicionamos a entender que os “puxadinhos” são soluções definitivas.
 
Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski, considerado um dos maiores romancistas e pensadores da história, bem como um dos maiores "psicólogos" que já existiram, disse: “A melhor definição que posso dar de um homem é a de um ser que se habitua a tudo”. Nos habituamos com esse problema?
 
Uns irão dizer que a culpa é dos navios gigantes, outros dirão que a culpa é dos políticos e outros dirão que a culpa é do município. Quando vamos deixar de culpar a terceira pessoa e nos apropriar desse problema que afeta a rotina e a vida de cada um de nós?
 
Sempre que você perceber que está tentando encontrar alguém ou algum fator externo para culpar a respeito de alguma frustração, tenha um momento de reflexão e faça um esforço para reverter a situação.
 
O problema não é deles (terceira pessoa) e sim meu e seu (primeira pessoa).
 
O porto não para e o projeto de uma ligação seca também não deve parar.
 
*Maxwell Rodrigues, executivo e apresentador do Porto 360°