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14/09/2022 - 08h17

Somos o celeiro do mundo?


Fonte: A Tribuna On-line / Maxwell Rodrigues*
 
Um slogan muito utilizado e de forma errada
 
Esse famoso termo foi um slogan criado na Era Vargas, onde a produção de trigo, soja e milho em grande escala enfatizava a relevância da agricultura brasileira.
 
Um “slogan” amplamente utilizado por muitos e de forma errada, pois “celeiro”, por definição, é uma estrutura onde são armazenados e estocados produtos agrícolas. Não creio que faça sentido utilizar este termo por não retratar a grandiosidade do agronegócio brasileiro.
 
Já é sabido que a nossa infraestrutura logística é ineficiente diante de um setor que cresce vertiginosamente a cada semestre, isso mesmo, semestre e não ano.
 
A expressão citada não se encaixa com a realidade, seja pela falta de estrutura no campo ou no transporte. Estima-se que perdas possam chegar a 30% em cada ciclo. Isso se agrava com o transporte de longo curso até o Porto de Santos. Esse percentual fica pelo caminho e no transbordo necessário pela falta de malha ferroviária ou pelo uso desenfreado do transporte rodoviário.
 
Nós não temos infraestrutura adequada para sermos considerados celeiro. Somos, sim, grandes produtores de commodities e exportamos para o mundo com custos altos, por exemplo. Commodity é preço e se não formos competitivos, a carga deixará o Porto de Santos, assim como já vem acontecendo para o Arco Norte.
 
A logística é impactada pela ausência do estado em investir no que é fundamental, criando entraves para que não seja feito aquilo que já deveria ter sido realizado.
 
Estamos tão atordoados comemorando recordes que não conseguimos enxergar o volume de oportunidades que o país possui. O agro conseguiu se desenvolver, mas hoje precisamos aumentar a capacidade nos portos, investir em logística integrada e na indústria nacional.
 
Em conversa com um especialista em logística, ouvi que o Brasil não é celeiro do mundo e faz um certo tipo de “escambo moderno”.
 
O escambo foi adotado pelos portugueses durante a exploração do pau-brasil. Eles não tinham interesse em realizar expedições de exploração no território brasileiro para encontrar ouro e prata (commodities), pois a prioridade era a comercialização de especiarias na Índia (produtos acabados e industrializados).
 
Deram início à exploração do pau-brasil, espécie com alto potencial de retorno financeiro. Fizeram um acordo baseado em escambo com os índios brasileiros. Os índios fariam o trabalho de identificação, derrubada das árvores e transporte das toras para as feitorias portuguesas. Em troca, receberiam objetos que seriam úteis no seu cotidiano, como machados, facas, entre outros.
 
Essa prática tem semelhança com os dias atuais? Plantamos, colhemos, transportamos e trocamos tudo isso por produtos acabados?
 
No agro, plantamos a soja, por exemplo, transportamos e em troca recebemos produtos acabados como o óleo de soja. Isso acontece com o café e outros. Na política, trocamos cargos por apoio ou outras indicações. No mercado, praticamos permuta.
 
Exportamos commodities com concentração de renda em determinados núcleos e com altos custos logísticos. Isso já é um gargalo na geração de empregos, criação de infraestrutura e aumento de capacidade.
 
É importante dar oportunidade para a indústria nacional, deixando de construir políticas publicas que foquem na escassez para valorar a gestão das dificuldades.
 
Nunca é tarde para aprender ou mudar de rota. Não utilizarei mais o termo 'celeiro do mundo'. Desejo ser o país mais industrializado do mundo pelo volume e capacidade de produção que temos.
 
*Maxwell Rodrigues, executivo e apresentador do Porto 360°