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17/03/2022 - 10h55

Regras de convivência dos futuros concessionários com os demais entes privados nos portos


Fonte: Anuário Informativo dos Portos / Bayard Umbuzeiro Filho*
 
A desestatização dos portos organizados brasileiros segue um modelo próprio, sem similar no mundo. Apesar de inspirado no modelo australiano, o nosso avança no controle e supervisão pelo poder público das tarifas a serem praticadas pelo concessionário. Isso porque o abuso na cobrança das tarifas dos demais agentes privados no porto foi justamente o que levou o modelo australiano ao fracasso.
 
Dito isso, vale destacar que por aqui o processo de desestatização corre em ritmo acelerado, incluindo os portos administrados pela Codesa, já com data prevista para leilão em 30/03/2022, e os portos de São Sebastião, Santos e Itajaí, em plena fase de consultas e audiências públicas.
 
O ritmo dos processos parece mais acelerado do que o mercado acha razoável para que as questões amadureçam, com o aprendizado proporcionado pelas primeiras experiências. Por outro lado, a predisposição de um novo governo em avançar na solução de problemas históricos, como a recorrente ingerência política na indicação de administradores dos portos e as dificuldades de contratação das obras públicas decorrentes das amarras da lei de licitações, poderá se perder. Nesse ponto destaca-se negativamente as constantes judicializações dos contratos de dragagem, que acabam prejudicando o calado operacional dos portos organizados. Fica então, por parte do setor privado, a dúvida sobre qual estratégia reduz mais danos.
 
Nesse contexto, a solução é participar intensivamente nas consultas e audiências públicas para interferir efetivamente nos resultados e contribuir para o aprimoramento dos modelos e editais que serão publicados, e que balizarão o funcionamento desses portos pelos próximos 35 anos. Isso tudo, sem deixar de considerar as particularidades regionais de cada porto a ser concedido.
 
No caso específico do Porto de Santos, o maior da América Latina, há uma preocupação com os eventuais conflitos de interesse entre o concessionário e os arrendatários, além dos Terminais de Uso Privado, que compõem o complexo portuário santista. Esses conflitos podem ocorrer tanto no âmbito da governança e gestão de contratos quanto na cobrança exorbitante de tarifas e preços pelo uso das infraestruturas e serviços oferecidos pelo monopolista privado, concessionário do porto.
 
A documentação apresentada na consulta pública cria a figura de um “Código de Conduta”, que deverá ser elaborado pelo vencedor da licitação e validado pelo poder concedente apenas após a celebração do contrato. Ali estarão as regras básicas de convivência do concessionário com os demais entes privados que operam no porto, incluindo os processos para reajustes de tarifas, reequilíbrio e renovação de contratos.
 
Esse código, embora estratégico, é a parte mais subjetiva de toda a documentação apresentada, uma vez que ela oferece apenas as diretrizes para a sua elaboração. Dessa forma, vale um esforço concentrado do setor privado nas contribuições à consulta pública para que já fiquem definidas, como compromisso do edital, pelo menos as regras básicas que minimizarão conflitos futuros entre as empresas.
 
*Bayard Umbuzeiro Filho é empresário e presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra), que representa as 52 maiores empresas administradoras de recintos alfandegados nos principais estados brasileiros.