Por Frederico Bussinger, consultor, engenheiro e economista
“Ponte não combina com porto”, explicara o Min. Tarcísio no
webinar de AT (AGO/20). Esta semana, durante visita a Santos, reafirmou sua preferência por túnel para a 2ª ligação seca trans-estuarina na Baixada Santista (a 1ª é a Rod. Piaçaguera-Guarujá).
Ademais;
instado pela Dep. Rosana Valle, apoiadora da campanha
“Vou de Tunel” (recente
iniciativa de 30 empresas do setor e da Associação de Engenheiros e Arquitetos de Santos -
AEAS), confirmou que o projeto integra os estudos para desestatização da Autoridade Portuária de Santos – APS (ex-Codesp); prevista para 2022.
As notícias e o apoio (de peso) repercutiram de imediato: apoiadores do túnel passaram a bater bumbo pelas redes sociais. Entre eles, alguns que, até há pouco, eram entusiastas da ponte: i) por imaginarem que túnel ou ponte virá sem ônus para usuários do porto e/ou para a população: “cavalo dado não se olha os dentes”; ii) daí, sonharem que ambos os projetos podem ser implantados paralelamente (por isso ora apoiam uma, ora outra alternativa); iii) ou, quiçá, por praticarem o “hay gobierno, soy a favor”!
Assim; se em 2019 o pêndulo do Fla-Flu parecia pender para a ponte, então também objeto de
campanha, ao que parece pende agora para o túnel. A propósito; pouco se tem ouvido falar da ponte: desistência, hibernação ou recuo tático?
Pode passar despercebido, mas curioso é que até a caracterização da 2ª ligação seca trans-estuarina foi alterada: a alternativa ponte, tratada pelo governo estadual, era a “Interligação entre SP-150 e SP-055” (Rod. Anchieta e Cônego Domênico Rangoni). Já o túnel, agora no bojo da desestatização (federal), passou a ser entre “Margem Direita-Esquerda” ou, de novo, “Santos-Guarujá”. Essas diferenças, de caracterização e de órbita de condução do processo (Estado ou União), explicáveis, para além da semântica têm implicações também sobre a modelagem e estruturação econômico-financeira do empreendimento:
Os cerca de R$ 3 bi de CAPEX da ponte seriam bancados pela Ecovias que, em contrapartida, teria o contrato de concessão (
Lote-22; MAI/98) do Sistema Anchieta-Imigrantes - SAI (e eventualmente de outras concessões) ampliado por “n” anos, via um 18º aditivo. Assim, em inexistindo pedágio específico para a ponte (como
insinuado pela concessionária!?), tais investimentos seriam arcados pelos pedágios rodoviários: o mecanismo ficara claro; mas a viabilidade jurídico-regulatória ainda precisaria ser construída.
Já o do túnel talvez só fique claro ao final dos estudos; previstos para daqui a um ano. Por ora apenas se sabe que pode ser uma das obrigações da concessão da APS. Como não deve haver filantropia, quatro origens/fontes são cogitáveis para o CAPEX: i) receitas de arrendamentos; ii) receitas acessórias (de ativos não operacionais ou de novos negócios a serem permitidos); iii) tarifas portuárias; ou iv) pedágio específico. A escolha da alternativa, individual ou conjugadamente, precisará ser cuidadosa; isso em sendo premissa não se onerar os custos portuários e/ou
assimetrias concorrenciais e regulatórias entre arrendamentos e TUPs existentes no Estuário.
A par das atividades portuárias, e seus
fluxos, hoje no centro do picadeiro, importante lembrar que há inúmeras questões e variáveis relativas à
mobilidade urbana e regional a considerar. Apesar de potencialmente serem esses fluxos os grandes usuários da 2ª travessia seca, segundo estudos de demanda, até agora são meros figurantes das análises e tratativas; como também as Prefeituras de Santos e Guarujá.
Em países-referência, planos estruturantes demandam longos e organizados processos de discussão e decisão. Em alguns casos, até, aprovação parlamentar em 2 legislaturas distintas, como forma de se bem legitimá-los. No Brasil tornou-se bordão que tais planos devam ser de estado, não de governo; certo?
Pois é! Ironicamente, no caso da 2ª travessia seca, para solução de um
problema ainda não perfeitamente definido e
“pacificado”, há não uma, mas 2 estratégias governamentais paralelas! E alimenta-se um Fla-Flu a revelar mais interesse em promoções e confrontos que na busca de
alinhamento das diversas partes interessadas (
“stakeholders”), como indicam as boas práticas internacionais: ainda há tempo de se alinhar os planos e o processo decisório.