Fonte: Folha de S. Paulo
Perda ou precarização do emprego terá consequências devastadoras para a população
Ainda que o artigo 18 da referida MP, que permitia simplesmente a suspensão do contrato sem qualquer contraprestação,
tenha sido revogado horas após a sua publicação, em decorrência de uma rápida e avassaladora reação da sociedade e das demais instituições, a sua mera proposição dá a dimensão da irresponsabilidade do governo.
O recuo do presidente, mantendo outros
pontos controvertidos da MP, confirma a estratégia do poder executivo de dar três passos à frente, recuar um, e, com isso, avançar duas casas no desmonte do estado social.
A adoção de medidas voltadas à proteção da saúde financeira das empresas não é apenas legítima, mas essencial. As empresas precisam, sim, ser ajudadas neste momento, até porque delas depende grande parte dos empregos. Para isso, além abertura de crédito e medidas no campo tributário, países como França, Dinamarca e mesmo os Estados Unidos criaram mecanismo de transferência de recursos para os trabalhadores, de forma a aliviar o peso do salário para as empresas.
Permaneceram na MP outras questões juridicamente obscuras. O artigo 2º. conferiu um ardiloso cheque em branco para empregadores, na medida em que possibilitou que acordos individuais se sobreponham aos acordos coletivos e à própria lei. Isso frustra não apenas a Constituição, mas vai também na contramão do que dispõe a Convenção 98 da OIT. Não devemos nos surpreender se esse dispositivo for utilizado, entre outras coisas, para reduzir salários, o que é vedado pelo artigo 7º., VI da Constituição Federal.
Outro aspecto preocupante diz respeito à atuação dos auditores do trabalho, que passarão a agir de maneira apenas orientadora, não podendo mais autuar empregadores que violem preceitos básicos de segurança no trabalho, salvo algumas exceções, frustrando assim o artigo 7º., XXII da Constituição Federal.
A MP também foi particularmente dura com os profissionais da saúde. Justo eles que estão colocando suas vidas em risco, em benefício da comunidade. Por intermédio do artigo 26, flexibilizou a extensão da jornada desses profissionais, o que certamente os exporá ainda a maiores riscos.
A MP 927 não passa de mais uma grande provocação governo, aumentando a tensão política e a insegurança política. Nada nela favorece os trabalhadores, nem mesmo a economia. Por esse motivo deve ser derrubada pelo Congresso Nacional.