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“Reforma passa pelo fim da contribuição obrigatória”

Fonte: ConJur



“Esse sistema de contribuição obrigatória de imposto sindical só serve para alimentar sindicatos fantasmas e para que alguns dirigentes se perpetuem no poder. As entidades não prestam o serviço que se espera.” A opinião é do ministro João Oreste Dalazen, presidente do Tribunal Superior do Trabalho em entrevista ao jornalista Fausto Macedo, do jornal O Estado de S. Paulo. Para Dalazen, uma reforma na organização sindical passa pelo fim da contribuição obrigatória e o monopólio da representação sindical.

Na entrevista, o ministro afirmou, ainda, que o sistema, do modo como está, não funciona. “O resultado é a criação de sindicatos que visam atender aos interesses preponderantemente das diretorias. No Brasil, com honrosas exceções, a criação de um sindicato transformou-se num grande negócio que só é bom para uns poucos dirigentes, não para os representados, sejam empregados ou empregadores”, disse.

O ministro vai propor alteração legislativa para permitir que os sindicatos negociem diretamente por empresa, não mais por categoria. O expediente que Dalazen sugere é a convenção coletiva especial. Em minuta que prepara, ele expõe seus argumentos ao Congresso.

Dalazen preside um setor do Judiciário que, em 2011, recebeu 2,15 milhões de novas reclamações trabalhistas. Sob seu poder e orientação estão 1.383 varas do Trabalho em todo o país, 24 tribunais regionais, 3 mil magistrados e desembargadores e 40 mil servidores. No TST lhe fazem companhia 26 ministros.

Nesta segunda (27/2), Dalazen inaugura no Fórum do Arujá, na Grande São Paulo, o processo judicial eletrônico — os autos irão transitar diretamente pelos computadores dos juízes e advogados das partes.

Aos 59 anos, juiz de carreira há 32, Dalazen é filho de família humilde de Getúlio Vargas (RS). Na infância e na juventude dividiu os estudos com atividades braçais — foi engraxate, lavador de caminhão, garçom, cobrador e balconista. "Venho de baixo, como se diz."

Leia entrevista concedida ao Estadão

Como reduzir os litígios na área trabalhista?

Os sindicatos devem negociar diretamente por empresa. Veja o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, sério, combativo, trava um diálogo permanente com as montadoras. Promove atuação inovadora e importante por meio do comitê sindical, órgão de representação no local de trabalho.

Como vê o modelo sindical?

Ultrapassado, arcaico. Isso se deve também ao fato de que, infelizmente, nossa organização prevê contribuição sindical obrigatória. Prevê monopólio da representação sindical. Em uma determinada base territorial, não pode existir mais de um sindicato, por exemplo, do comércio varejista.

O senhor é contra a contribuição?

Esse sistema de contribuição obrigatória de imposto sindical só serve para alimentar sindicatos fantasmas e para que alguns dirigentes se perpetuem no poder. As entidades não prestam o serviço que se espera. Bastaria que acabássemos com a contribuição sindical obrigatória e com o monopólio da representação sindical para que se produzisse profunda reforma na organização sindical.

Como é possível?

Precisamos ratificar a Convenção 87 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), de 1948. A maioria dos países ratificou, o Brasil não. A Convenção prevê regime de ampla liberdade sindical, possibilidade de surgirem sindicatos espontaneamente e desvincula o sindicato do Estado. Nosso modelo é inspirado no sistema fascista e corporativista dos anos 30.

O que isso acarreta?

O sistema é engessado, não funciona. O resultado é a criação de sindicatos que visam atender aos interesses preponderantemente das diretorias. No Brasil, com honrosas exceções, a criação de um sindicato transformou-se num grande negócio que só é bom para uns poucos dirigentes, não para os representados, sejam empregados ou empregadores. A reforma sindical que defendo alcança a área patronal e a de empregados.

Os sindicatos não atendem seus representados?

Vemos hoje inúmeros dirigentes sindicais que permanecem por décadas na direção de sindicatos ou de federações e confederações. Isso não é bom para a sociedade. Tenho grande apreço pelo movimento sindical, mas é forçoso reconhecer que nosso modelo é ultrapassado.

O sistema atual não é bom?

Só favorece as cúpulas sindicais, que permanecem indefinidamente no poder, à sombra de benefícios, sob os auspícios da famigerada contribuição sindical obrigatória. Se há a receita compulsória, é claro que não há estímulo para a sindicalização, novos associados que passem a contribuir espontaneamente como em qualquer associação. O descompasso é tão grave que nas negociações coletivas, sobretudo quando há dissídio, grupos negociam com empregados e não com os sindicatos, correntes opostas em uma mesma categoria defendem pontos de vista e pleitos diversos.

A contribuição é um mal?

A Medida Provisória que reconheceu as centrais sindicais permitiu que repartissem entre si parte da receita bilionária da contribuição sindical, o que propiciou a proliferação de sindicatos e uma guerra entre as centrais. Isso desestimula.

Sindicato deve prestar contas?

Não há nada que obrigue as entidades a prestarem contas do que recebem a título de contribuição. Foi vetado preceito da lei que previa a obrigatoriedade da prestação de contas ao Tribunal de Contas da União. As entidades chegaram praticamente ao paraíso. Imagine esse cenário: não presta serviços, aufere receita financeira polpuda e não presta contas das receitas, nem da aplicação dos valores. O sistema vive ciclo vicioso e, assim, se perpetua esse estado de coisas que só favorece dirigentes, com honrosas exceções.

A Justiça do Trabalho não dá conta de tanta demanda?

As providências ortodoxas de modernização da Justiça do Trabalho já se esgotaram, como a criação de cargos, novas varas, ampliação do quadro de magistrados e servidores. Em seus 70 anos, a Justiça do Trabalho apenas cresceu do ponto de vista quantitativo. Eram oito tribunais regionais e passaram a 24. Como está, o sistema não pode continuar. Além de constituir máquina pesada e onerosa para o Estado, não consegue dar vazão com a celeridade desejada aos milhões de processos. Em 2011, só nas varas do Trabalho deram entrada 2,15 milhões de reclamações, sem falar nos tribunais regionais e no TST.

O que é o processo eletrônico?

A implantação do processo eletrônico decorre não apenas dessas circunstâncias, mas de uma lei federal que obriga os órgãos do Poder Judiciário a encerrar a era dos autos impressos. Desde a criação dessa lei inúmeros sistemas eletrônicos foram desenvolvidos, mas cada um procurou resolver o problema a seu tempo e modo, sistemas e linguagens diferentes, que não se comunicam. Mais de 40 sistemas diferentes existem no Judiciário. A Justiça do Trabalho conseguiu, enfim, desenvolver um sistema uno e definitivo.

Como vai funcionar?

Vai substituir todos os outros no âmbito da Justiça do Trabalho. Começou a ser implantado em dezembro, em Navegantes (SC), depois em Caucai (CE) e Várzea Grande (MT). Agora em Arujá (SP). Vai proporcionar celeridade porque não terá mais aquela papelada, os autos físicos. Também vai propiciar ganho extraordinário porque estamos falando de um modelo sem filas, sem congestionamentos, de portas abertas da Justiça, dia e noite, pois as partes e seus advogados poderão acessar processos a qualquer hora.

Na prática, como vai ser?

Sem sair de seu escritório, o advogado, com verificação digital e senha que o incluirá no nosso cadastro, poderá peticionar à Justiça e, automaticamente, haverá distribuição do processo para uma vara. Apertando um botão, da mesma forma, haverá a designação da audiência.

Quanto tempo um processo trabalhista leva para terminar?

Em primeira instância até o tribunal regional cerca de um ano. Esse prazo vai cair pela metade. Todo processo judicial tem alguns atos básicos que não podem deixar de ser cumpridos, postulação de direitos, fase de defesa, probatória, de recursos e julgamento pelos tribunais.

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