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Extensão da redução de salários suscita debate sobre a estabilidade

Fonte: Valor Econômico
 
O projeto de lei de conversão da MP 936 aprovado pela Câmara dos Deputados deve provocar um debate sobre a “estabilidade” do emprego aos trabalhadores submetidos à suspensão de contrato de trabalho e à redução de jornada e de salários. O texto votado pelos deputados permite ao Poder Executivo prorrogar essa redução de jornada e a suspensão de salários pelo período que durar o estado de calamidade pública, previsto para terminar no fim de 2020. Para advogados trabalhistas, com a perspectiva de prolongamento maior que o esperado da crise, empresas em dificuldade não terão como cumprir a estabilidade e, em muitos casos, tenderão a optar pela demissão, em vez da prorrogação de medidas de redução de jornada ou suspensão de trabalho. O Projeto de Conversão em Lei da MP 936 (PLV 15/2020) ainda será votado no Senado. 
 
Os prazos originalmente estabelecidos pela MP 936 eram de 90 dias para redução de jornada e de 60 dias para suspensão de contrato de trabalho. As medidas foram estabelecidas como forma de tentar preservar os empregos por empresas afetadas pela pandemia e, por isso, contemplam auxílios devidos pelo governo federal, conforme a faixa de renda e o nível de redução de jornada. Como medida de proteção ao trabalhador, a MP também estabeleceu a chamada “garantia provisória de emprego”, espécie de estabilidade por igual período em que houver a redução de jornada. Se houver redução por 90 dias, por exemplo, o empregado tem outros 90 dias de estabilidade.
 
“Se isso for mantido e a empresa estender por 90 dias adicionais a suspensão de jornada, isso quer dizer que o período de estabilidade será de 180 dias”, avalia Eduardo Fleury, sócio do escritório FCR Law. “Isso, além de ser bastante polêmico, pode ser prejudicial às empresas. Não é momento de criar muitas obrigações às companhias porque elas podem não ter demanda suficiente para garantir empregos ao fim do período de redução de jornada. Para muitas será preferível demitir agora. Não adiantar resolver o problema por dois ou três meses e depois soltar uma bomba para a empresa lá na frente.”
 
O advogado trabalhista Marcelo Fortes, sócio do Fortes & Prado Advogados, diz que a estabilidade é uma obrigação “pesada”. Algumas empresas que reduziram a jornada já veem dificuldade à frente para garantir o emprego. “Muitas empresas certamente irão demitir em vez de fazer nova prorrogação e se comprometer com uma estabilidade maior, mesmo que o custo da demissão seja grande.” Clemente Ganz Lúcio, consultor do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), diz que a prorrogação da redução de jornada tem apoio das centrais sindicais para este momento específico de pandemia. Ele defende que qualquer extensão de prazo da medida seja feita sob as condições estabelecidas originalmente pela MP, o que inclui tanto forma de cálculo do benefício pago pelo governo federal quanto a estabilidade garantida aos trabalhadores. Ele explica que as centrais pleitearam o aumento do benefício pago pela União, mas o dispositivo caiu na votação dos deputados.
 
Pela MP, se houver demissão sem justa causa no período de estabilidade, o empregador deverá pagar, além das verbas rescisórias, uma indenização pelo período remanescente da garantia de emprego. No caso de reduções de jornada de 25%, por exemplo, a indenização é de 50% dos salários que aos quais o empregado teria direito. Os advogados lembram que o PLV 15/2020 não estabelece a forma pela qual o Executivo poderá prorrogar os prazos de redução de jornada. “Teoricamente poderia ser até por decreto”, diz Fleury. Mas isso não seria recomendado, afirma ele, porque poderia causar insegurança jurídica e tornar ainda mais polêmico o debate sobre a estabilidade. 
 
O instrumento mais indicado e apropriado para essa prorrogação, diz Fortes, seria uma outra medida provisória. Nesse caso, salienta, o governo poderia propor novas condições, inclusive para a estabilidade. Mas a nova MP, lembra, se sujeitaria também à aprovação no Legislativo.
 
Além de prorrogar os prazos de redução de jornada e de suspensão de contrato de trabalho, o texto aprovado pelos deputados também incluiu dispositivos que não constavam originalmente da MP 936. Um deles é sobre o benefício emergencial de R$ 600 pago pelo governo federal. A MP garante o benefício, explica Fortes, a trabalhadores com contrato intermitente de salário que não preenchem os requisitos necessários ao seguro-desemprego. Outra disposição incluída pelos deputados, aponta Fleury, é a da chamada desoneração de folha, benefício pelo qual empresas de alguns setores, como tecnologia da informação (TI) e têxteis, podem optar por pagar contribuição previdenciária sobre um determinado percentual da receita bruta em vez de 20% calculados sobre a folha de salários. O benefício seria extinto ao fim deste ano e foi prorrogado até dezembro de 2021.
 

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