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Vagas de estágio e aprendizagem caem 84% durante pandemia

Fonte: O Estado de S. Paulo
 
Além de processos seletivos congelados, empresas também demitem estagiários; na contramão, companhias de setores como alimentação, marketing e farmacêutica mantêm contratações
 
A pandemia do novo coronavírus trouxe impactos importantes para a vida de estagiários e jovens aprendizes. Um levantamento feito pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) com exclusividade para o Estadão mostra que, em abril, o número de vagas de estágio e aprendizagem disponíveis na plataforma caiu 84% em relação ao mesmo mês de 2019.
 
No ano passado, a companhia ofereceu 33 mil vagas em abril, contra cerca de 5 mil no mesmo período deste ano. A queda tem aumentado ainda mais com o passar da quarentena no País. Em março, embora tenha caído 55% o número de vagas quando comparado com o mesmo mês de 2019, a empresa ainda oferecia 29 mil delas.
 
“A questão de emprego dos jovens já vinha sendo muito difícil no País. Já tínhamos 27% de desemprego entre eles, contra 13% na população adulta, mas a pandemia acelerou bastante a situação. Nós já tivemos mais de 230 mil estagiários, agora temos menos de 200 mil”, conta o CEO do CIEE, Humberto Casagrande.
 
A diminuição no número de vagas acompanha a queda na efetivação de contratos. Em abril deste ano, a plataforma fechou 4,3 mil contratos, contra 28,7 mil no mesmo período do ano passado. Antes, o CIEE estava habituado a concretizar 2 mil contratos de estágio por dia, agora o índice é de 170.
 
A reportagem entrou em contato com várias empresas que tiveram seus programas de estágio cancelados ou suspensos. Apenas a Stone se manifestou. Segundo a fintech, as etapas presenciais do processo seletivo estavam previstas para maio e junho e, por conta da forma como é conduzido, foi suspenso.
 
“Ele também é um programa de formação de talentos da empresa, que engloba formar entre 100 e 250 pessoas de maneira presencial. Ou seja, não achamos prudente colocar essas pessoas em risco. Estamos achando um período interessante para nos reinventar”, diz a líder de atração de talentos, Lívia Kuga.
 
Demitidos no meio da pandemia
 
Em um cenário no qual milhares de trabalhadores vêm sendo demitidos no País, os estagiários também entram na conta. Segundo o CIEE, 15% dos estagiários que a companhia já empregou foi dispensado entre março e abril.
 
A estudante de direito Carolina R., de 23 anos, era estagiária de um escritório de advocacia na capital paulista havia quase um ano e chegou a fazer duas semanas de home office no início do isolamento social, mas foi demitida.
 
“O meu contrato acabaria em julho, com possível chance de efetivação, mas todos os estagiários foram mandados embora com a justificativa de que o escritório não teria verba para nos manter”, conta. Segundo ela, os advogados de nível júnior tiveram férias compulsórias, mas não houve outras demissões.
 
Para Casagrande, embora não seja o caso de Carolina, as demissões ocorrem, principalmente, nos setores que não conseguem implementar o home office. “Como o estagiário não tem vínculo trabalhista, as empresas preferem dispensar, o que chama a atenção porque estagiário normalmente não é demitido. Existe rotatividade porque eles se formam e surgem outros, mas o cancelamento de vagas de estágio é inusitado.”
 
Já em relação aos aprendizes, Casagrande explica que eles não podem ser dispensados, pois a Lei da Aprendizagem prevê contrato de dois anos que não pode ser interrompido – salvo a suspensão do contrato prevista pela MP 936. “No entanto, nos casos em que os contratos chegam ao fim, temos visto muitas empresas preferindo ficar ilegais do que repor as vagas neste momento”, explica.
 
Por isso, o CIEE encaminhou ao Ministério da Economia uma proposta para a criação de 400 mil vagas para aprendizes em pequenas e médias empresas. Com o projeto, o governo ficaria responsável por arcar com 50% dos salário.
 
“Seria bom para as empresas, que teriam mão de obra para fazer a retomada da economia, e para os jovens terem emprego. Os valores representam menos de 0,5% do orçamento federal destinado ao programa do coronavírus”, defende Casagrande.
 
Empresas mantêm programas
 
Na contramão da queda de vagas, também há empresas que optaram por manter os seus programas de estágio mesmo durante o período da pandemia.
 
“Assim que o isolamento começou, basicamente todos os processos foram congelados, mas alguns setores os mantiverem, como as startups de mercado online e as empresas de foodtech relacionadas ao delivery. Conseguimos também contratar estagiários da área de marketing digital porque começou a ser uma dor das empresas”, explica Diego Cidade, CEO da Academia do Universitário, plataforma de desenvolvimento e seleção de estagiários.
 
A empresa tem hoje cerca de 30 clientes e três vagas de estágio em aberto. Durante a pandemia, mudou sua atuação para focar na capacitação das empresas que passaram a fazer o onboarding online.
 
A Companhia de Estágios também percebeu uma queda no número de contratações na pandemia. Enquanto tiveram mais de 1.800 vagas abertas no primeiro semestre de 2019, a previsão é de cerca de 1.200 para o mesmo período neste ano.
 
“Mas a gente também viu empresas que, para manterem os programas, diminuíram um pouco o número de vagas ou as adiaram para o segundo semestre. Neste caso, os estagiários que estão empregados atualmente vão sair e não vão ser repostos agora”, explica o CEO Tiago Mavichian.
 
Segundo ele, o número de cadastros na plataforma também diminuiu cerca de 14%. “Isso mostra que as pessoas não estão buscando vaga o quanto poderiam, talvez por achar que não têm. Mas existem vagas.”
 
Entre os clientes da Companhia de Estágio, os que mantiveram os processos seletivos são de áreas como construção civil, mercado farmacêutico, alimentos, tecnologia da informação e finanças, como bancos e corretoras.
 
A farmacêutica Sanofi optou por manter seu programa semestral de estágio, que já estava com inscrições abertas quando os primeiros casos de covid-19 começaram a aparecer no Brasil.
 
“Reduzir vagas ou interromper o programa não eram opções porque comprometeria muito o nosso ciclo de contratações. Então tivemos que reestruturar. Decidimos fazer um programa 100% digital. Foi ágil, assertivo e tivemos um bom feedback. Hoje a gente repensa se para o próximo não conseguimos entregar algo assim também”, explica a gerente de Atração de Talentos da Sanofi, Ana Botelho.
 
A estudante de farmácia Noely Sampaio, de 21 anos, é uma das 58 estagiárias que, na última semana, começaram a trabalhar na empresa. No caso dela, como sua função é na área de desenvolvimento de produtos em atividade considerada essencial, o trabalho é presencial. Já os estagiários que assumiram funções administrativas fizeram o onboarding online e trabalham em home office, como a maior parte da empresa.
 
“Quando a pandemia surgiu, eu achei que o processo ia parar ou ser adiado, já que estávamos ouvindo sobre desemprego. Estava tentando outros processos e eles não adotaram o modelo online. Depois que começou a pandemia, não tive mais retorno de nenhum deles”, conta a estudante, em seu primeiro estágio.
 
No setor de delivery, a Rappi também manteve a estreia de seu programa de estágio no Brasil. Em maio, a empresa abriu 25 vagas para estudantes de engenharia, ciência da computação, economia, administração, marketing e publicidade.
 
“Diante do atual cenário, mais do que nunca, precisamos de talentos que se identifiquem com a nossa cultura, que queiram entrar para o time e causar um impacto positivo na vida de tantas pessoas. E, por isso, não pensamos em adiar o lançamento por causa da pandemia”, conta o head of people da Rappi Brasil, Martin Martorell. A previsão é que os novos contratados comecem de forma remota a partir de julho.
 
Para as empresas não cancelarem as contratações
 
Por Tiago Mavichian, da Companhia de Estágios
 
• Coloque os estagiários em home office;
 
• Nos casos em que a atividade desempenhada não consiga ser realizada em home office, dê férias;
 
• Quando as férias acabarem, reduza a carga horária. A Lei do Estágio tem a prerrogativa de poder contratar o estagiário por menos horas. Para ele é bom porque tem a certeza de receber algum salário, ainda que reduzido, e que irá voltar ao normal quando tudo passar, e a empresa garante que não gastará mais para novas contratações e treinamentos no futuro.
 

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