Notícias

Santos e Guarujá sonham com ponte 92 anos após o primeiro projeto

Fonte: G1 Santos
 
Orçado em 2,9 bilhões, projeto atual é composto por uma ponte e trechos com elevados em viadutos que somam 7,5 quilômetros.
 
 
Sonho antigo da população da Baixada Santista, no litoral de São Paulo, a ligação seca entre Santos e Guarujá está perto de sair do papel. O primeiro projeto, do engenheiro e arquiteto Enéas Carneiro, era um túnel, datado de 1927. Entre ele e o atual plano, lá se vão 92 anos de espera, falsas promessas e frustrações.
 
De acordo com a Secretaria de Logística e Transportes (SLT) do estado de São Paulo, existe empenho por parte do governo para concretizar o projeto. Atualmente, a SLT, Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e Companhia Docas do estado de São Paulo (Codesp) estão em tratativas para definir o melhor projeto para a região e análise sobre o impacto da ponte nos planos de expansão do Porto de Santos. No momento, a construção da ponte está em análise na Artesp e aguarda licença ambiental.
 
A estrutura será erguida pela Ecovias, concessionária que administra o Sistema Anchieta-Imigrantes (SAI). A empresa desenvolve o projeto e a obra em troca da extensão do contrato para exploração do SAI. Em fevereiro, o governador João Doria (PSDB) deu sinal verde para o prosseguimento das tratativas.
 
Segundo a Ecovias, o projeto é composto por uma ponte e trechos com elevados em viadutos que somam 7,5 quilômetros. A estrutura conecta a Via Anchieta, no km 64, à Rodovia Cônego Domênico Rangoni, no km 250, viabilizando, inclusive, um segundo acesso à avenida portuária, conforme premissas requeridas pela Codesp.
 
O objetivo é facilitar a integração entre as cidades de Santos e Guarujá, proporcionar fácil e rápida movimentação logística do Porto e ser uma opção de mobilidade urbana, somada ao sistema de balsas.
 
Ainda de acordo com a concessionária, a interligação entre margens reduz o percurso de 45 km para menos de 10 km, tornando a travessia do canal mais rápida, além de melhorar a operação de tráfego de navios devido menor frequência das balsas, aumentar a capacidade de circulação de bens e pessoas entre as cidades da Baixada Santista, ampliar a oferta de empregos diretos e indiretos, atender às demandas locais de circulação de veículos e cargas e, consequentemente, contribui para a melhoria na qualidade de vida da população da região.
 
Em visita ao Grupo Tribuna, o secretário estadual de Logística e Transportes, João Octaviano Machado Neto, afirmou que os trabalhos deverão durar 36 meses, contados do início da obra. A construção tem custo estimado de R$ 2,9 bilhões.
 
Sonho quase centenário
 
Há pelo menos 92 anos a população da Baixada Santista convive com projetos de uma ligação seca entre Santos e Guarujá. Essa história teve início quando o governo de São Paulo era dirigido por Júlio Prestes, passando por Adhemar de Barros até chegarmos em José Serra e Geraldo Alckmin. Todos eles fracassaram.
 
O primeiro empreendimento surgiu em 1927, com o engenheiro e arquiteto brasileiro Enéas Marini, como relatou o jornalista, escritor e pesquisador Sergio Willians, em A Tribuna, em edição publicada no dia 22 de janeiro de 2017.
 
Marini pretendia a construção de um túnel submerso entre a região portuária de Santos com os futuros distritos de Itapema, Bocaina e Guarujá. À época, a Ilha de Santo Amaro era considerada parte do município, até a emancipação política, em 1934.
 
A estrutura partiria do velho mercado do Paquetá até a estação de barcas de Guarujá. Um percurso de 900 metros de extensão e que poderia ser feito, de acordo com o seu projetista, em 40 segundos, de automóvel.
 
Marini alegava possuir recursos financeiros necessários para a obra que, hoje, girariam em torno de R$ 600 milhões, e propunha um contrato de concessão de 30 anos junto ao governo do Estado, além de uma série de isenções.

 
A primeira ponte
 
Na década de 40, o engenheiro civil e arquiteto Francisco Prestes Maia elaborou o Plano Regional de Santos. Ele, que em duas oportunidades governou a cidade de São Paulo, contava com o apoio do então governador Adhemar de Barros para disseminar o projeto na Baixada Santista.
 
O estudo de Prestes Maia visava trazer modernização a Santos, com desenvolvimento do Porto, do turismo e da indústria. O plano virou um livro, dividido em capítulos, sendo que o oitavo tratava, especificamente, da ponte que ligaria as ilhas de São Vicente e Santo Amaro. A ideia do engenheiro era a construção de uma ponte levadiça, nos moldes da Tower Bridge, em Londres, na Inglaterra.
 
Parte das ideias de Prestes Maia foi absorvida pelo município, mas o projeto de ligação seca foi, novamente, engavetado.

 
O projeto de Luiz Muzi
 
Poucos anos depois, o engenheiro paulistano Luiz Muzi apresentou um novo projeto para a ponte entre Santos e Guarujá.
 
A proposta foi relembrada nas páginas do Jornal A Tribuna de Santos, em 20 de maio de 2018. Muzi projetou uma ponte com 500 metros de vão, sobre a entrada do estuário, ligando as ilhas.
 
No desenho, o sistema permitia um trânsito livre às embarcações no canal de acesso ao Porto. Além disso, ela seria implantada na área onde hoje está o Ferry Boat. O acesso seria feito por meio de uma rampa ao estilo 'caracol'.
 
Seriam percursos rotatórios, em rampas dispostas em forma helicoidal, que garantiriam a altura da estrutura de modo a não afetar o vaivém dos navios, ao mesmo tempo em que não interromperia o fluxo de veículos na passagem entre Santos e Guarujá.
 
Muzi chegou a apresentar duas versões: uma com a construção das torres dentro d’água. A outra exibia as bases na parte terrena. No entanto, assim como o plano de Prestes Maia, a ideia do engenheiro não prosperou.


 
A ponte estaiada e a maquete
 
Em março de 2010, o então governador José Serra (PSDB) anunciou o projeto da ponte estaiada que ligaria as cidades. À época, o governo do Estado anunciava um complexo de 4,6 km, sendo 1 km de ponte que beneficiaria os cerca de um milhão de pessoas que vivem em Santos, São Vicente e Guarujá.
 
"Com esta ponte nós vamos quebrar um gargalo que é muito importante aqui na região da Baixada Santista. Além disso, a ponte terá até um papel paisagístico", disse Serra ao anunciar a obra.
 
Estimadas em cerca de R$ 700 milhões, as obras tinham duração prevista de 30 meses, após a assinatura do contrato. O projeto incluía duas faixas em ambos os sentidos, em um total de 4,8 km de novas pistas, com um quilômetro de trecho estaiado. Segundo o governador, o Estado daria "conta de todos custos”.
 
Para atender às especificações do porto, a altura da estrutura foi projetada em 80 metros, com declividade máxima de 6%. Do lado de Santos, o acesso à ponte era planejado pela avenida Mário Covas, próximo à avenida Cel. Joaquim Montenegro (Canal 6). Em Guarujá, seria na avenida Santos Dumont, próximo ao rio Santo Amaro.
 
O que mais marcou o projeto, no entanto, foi a cerimônia realizada no Ferry Boat, no lado santista, na Ponta da Praia. Com presença dos prefeitos João Paulo Tavares Papa e Maria Antonieta de Brito, de Santos e Guarujá, do deputado Beto Mansur, entre os outros políticos, Serra apresentou uma maquete da ponte. No entanto, um ano depois, o projeto foi abandonado.
 
O túnel de Alckmin
 
Exatamente três anos após José Serra apresentar a maquete da ponte estaiada, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou a entrega do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/Rima) para a construção do túnel submerso que ligaria Santos ao Guarujá.
 
Orçado inicialmente em R$ 2,4 bilhões, o projeto previa uma estrutura de 762 metros de extensão, 950 metros de rampas e cerca de 4,5 km de obras viárias em superfície e em viadutos. O túnel era composto por seis módulos de concreto pré-moldado, que seriam construídos em uma doca seca localizada no Guarujá.
 
Depois de finalizados, os módulos seriam rebocados flutuando até o local onde seriam colocados submersos. Após a imersão, cada elemento seria encaixado e fixado aos anteriores, formando o túnel.
 
As obras, planejadas para serem concluídas em 36 meses, teriam que ter iniciado no primeiro semestre de 2015, com previsão de entrega em 2018. No entanto, o projeto enfrentou problemas financeiros.
 
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) não aceitou uma cláusula da licitação para formação dos consórcios concorrentes que previa a transferência de tecnologia por meio da exigência de participação de duas empresas brasileiras, com pelo menos 20% do capital cada uma.
 
Com isso, o governo estadual teve de abrir mão de empréstimo de US$ 506,7 milhões (em torno de R$ 1,124 bilhão à época). Sem o BID, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que já destinaria R$ 962 milhões, assumiu o outro montante.


 
No entanto, a crise enfrentada pelo País fez com que os valores fossem congelados pelo BNDES. Em 2016, Alckmin anunciou que esperaria a conclusão do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff para dar continuidade ao projeto que, naquele momento, já estava orçado em R$ 2,8 bilhões, tendo sido investidos R$ 40,5 milhões no projeto executivo.
 
Posteriormente, o túnel também foi alvo do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP). O colegiado determinou que a Dersa corrigisse o edital da obra do túnel submerso e abrisse uma nova licitação. Na decisão, assinada pelo conselheiro Dimas Eduardo Ramalho, o tribunal apontou 24 falhas contidas no primeiro edital da obra e pediu para que elas fossem retificadas em uma nova versão.
 
A proposta também foi alvo de críticas de moradores do Estuário e do Macuco, bairros de Santos que seriam diretamente atingidos pela obra, já que o acesso ao túnel, pelo município, seria feito naquela localidade.


 
No entanto, com o período de recessão, e o contingenciamento de gastos por parte do Governo Federal e do Governo do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin decidiu deixar o projeto de lado.
 
Neste ano, porém, a Secretaria Estadual de Logística e Transportes retomou os debates para a construção do túnel submerso entre Santos e Guarujá. Ainda em fase embrionária, o plano consiste em atrelar a entrega do equipamento a projetos estruturais para a região. O entrave é como encaixá-lo em obras viáveis economicamente.
 
"A visão é que o túnel só vai fazer sentido se introduzido em um pacote maior. Sozinho, terá dificuldade para se viabilizar", disse o secretário João Machado. Por ser um projeto de mobilidade urbana, afirma, não “entra nos planos de concessão rodoviária".
 
Com custo estimado, por ora, em R$ 2,8 bilhões, não seria atrativo se o retorno financeiro viesse apenas de tarifa de pedágio. “É preciso estudar quais são os projetos disponíveis para introduzir o túnel como uma contrapartida (da empreiteira para o Estado)”, finaliza o secretário.
 

Imprimir Indicar Comentar

Comentários (0)

Compartilhe