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Terceirização sem extremos é instrumento antidesemprego

Fonte: Folha de S. Paulo / Sergio Firpo*
 


Flexibilização tem o importante papel de agregar os riscos setoriais e reduzir os custos de transação.
 
A terceirização tem sido objeto de intenso debate. Os que defendem a sua plena instauração legal sustentam que as nossas leis trabalhistas não dão conta das recentes mudanças no mundo do trabalho. Os críticos a veem como um instrumento legal que nega ao trabalhador seus direitos previstos em lei.
 
O debate está recheado de ideologia dos dois lados e tem pouca reflexão analítica. Acaba-se aprendendo pouco sobre os efeitos de sua adoção, sobretudo como instrumento de preservação do emprego e geração de ganhos de eficiência para a economia.
 
A crítica toma como paradigma da terceirização o que é o seu caso extremo, aquele em que cada trabalhador é um prestador de serviços, atuando como microempresário ou autônomo. A contratação dos serviços aboliria formalmente, mas não de fato, as relações de trabalho.
 
Mesmo nesse caso extremo, não é claro que o trabalhador estaria necessariamente em uma precária relação factual de trabalho. Se as novas condições contratuais forem melhores, o trabalhador daria um preço a benefícios como férias remuneradas, 13º, multas sobre demissão sem justa causa e outros.
 
Mas a discussão sobre se uma relação de trabalho que não está sob a égide da CLT significa perda ou renúncia recompensada de direitos não ajuda muito a entender os potenciais ganhos da terceirização. O caso intermediário, aquele em que a empresa contrata uma firma especializada em determinada atividade e cujos trabalhadores têm carteira assinada, é mais elucidativo, pois para ele não valem os argumentos de que há precarização.
 
Tome como exemplo um trabalhador que presta serviços de limpeza em uma loja de produtos importados, com a carteira de trabalho assinada por uma empresa de limpeza. Suponha que a mesma empresa de limpeza preste serviços para uma fábrica cuja produção é exportada.
 
O que aconteceria se houvesse uma desvalorização do real? Haveria mais incentivos para a fábrica expandir sua produção e precisar de mais pessoal para limpeza. Em contrapartida, como ficou mais caro importar, os preços finais ao consumidor da loja aumentariam, reduzindo a demanda. Talvez a loja não precisasse mais de tantas pessoas na limpeza.
 
Com a terceirização, a firma de limpeza realocaria parte de seus funcionários da loja para a fábrica. Não há custos relevantes. Ninguém desse setor fica desempregado, apenas se muda o local onde esses trabalhadores exercem suas atividades.
 
Sem a terceirização, os funcionários da loja seriam demitidos, ela teria que arcar com custos de demissão e o trabalhador dispensado teria acesso a todos os benefícios previstos em lei.
 
A fábrica, que precisaria urgentemente de novos funcionários de limpeza, teria agora que oferecer um salário artificialmente maior ao ex-funcionário da loja para fazê-lo abrir mão do seguro-desemprego. A fábrica ficaria numa situação aquém da ideal, pois ela gostaria de pagar um salário equivalente à produtividade de um trabalhador de limpeza, mas não há quem esteja disposto a aceitar essa oferta.
 
Nesse exemplo, fica claro que a terceirização tem o importante papel de agregar os riscos setoriais e reduzir os custos de transação. Ao permitir que trabalhadores continuem a ser remunerados pela sua produtividade, a terceirização reduz a ociosidade dos fatores de produção, aumentando a eficiência da economia como um todo.
 
Por fim, note que o argumento acima vale tanto para atividade-fim como para atividade-meio. Afinal, como distinguir o que é o quê?
 
A incapacidade prática de se separar o que é meio do que é fim deveria ser suficiente para mostrar quão estéril é esse debate.
 
A propósito, o debate sobre terceirização e flexibilização das leis trabalhistas se beneficiaria de menos ideologia e mais reflexão analítica de ambos os lados.
 
*Sergio Firpo é professor titular do Insper 
 

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